sexta-feira, 20 de abril de 2018

COMEÇOU UM NOVO 1968 NA FRANÇA?

(o que é mostrado abaixo está ocorrendo
HOJE, não meio século atrás!)
Lê-se na edição digital do jornal francês Le Monde que trabalhadores de ferrovias e hospitais, carteiros e funcionários públicos estavam ontem (19/04/2018) lado a lado com estudantes em atos convocados pela CGT e Solidaires (as centrais sindicais de esquerda e extrema-esquerda). 

O título: Entre 119.500 e 300.000 manifestantes contra governo, sendo o primeiro número da polícia e o segundo, dos organizadores.
Estará renascendo na França/2018...

O Libération destaca que o prédio principal da Sciences-Po, escola na qual o presidente Emmanuel Macron se formou, foi tomado por estudantes contrários à ditadura macroniana.


E,  mais reacionário ainda do que o Jair Bolsonaro, Le Figaro mancheteou o que torce muito para ver tornar-se realidade: Franceses divididos sobre uso da força para evacuar universidades.

Da minha parte, torço exatamente pelo contrário: para as manifestações se avolumarem a tal ponto que reeditem as jornadas de 1968, reatando os fios da História. 

Trata-se de uma esperança que frequenta meus escritos há décadas. Talvez a explicação mais completa que dei tenha sido esta:
...a esperança que inspirou o mundo em 1968?
"...a União Soviética, sob a tosca tirania de Stalin, serviu como espantalho para a propaganda capitalista dissuadir os operários das nações economicamente mais avançadas de seguirem na mesma direção. 

Contrariando a constatação de Marx, segundo quem eram os países mais pujantes que determinavam o destino da humanidade, com as demais sendo arrastados por sua dinâmica, as revoluções seguintes se deram em países pobres, desorganizados por guerras ou ainda emancipando-se da dominação colonial.

E o capitalismo foi aprendendo a lidar de forma cada vez mais eficiente com as várias tentativas vanguardistas que foram surgindo: seja vencendo militarmente as guerrilhas urbanas e rurais, seja asfixiando economicamente ou derrubando governantes adversos por meio das Forças Armadas, do Judiciário ou do Legislativo de seus respectivos países.

Mas, a revolta jovem de 1968 na França foi o primeiro indício de que a História não tem fim e, quando algumas portas se fecham, outras se abrem. O capitalismo não tem tudo dominado, nem jamais terá; pelo contrário, marcha em passos rápidos para a extinção, que só vai significar o fim da História profetizado por Francis Fukuyama se a própria espécie humana extinguir-se junto com ele.
Uma nova esquerda despontou em 2013. E foi tratada a pontapés pela velha...
A sociedade que desenvolveu ao máximo os meios de comunicação é também a sociedade em que uma simples centelha evolui rapidamente para incêndio, surpreendendo governos e suas polícias.

Já em 1968, uma onda de paralisações em escolas de Paris evoluiu rapidamente para uma formidável greve geral, fazendo o presidente De Gaulle balançar no cargo, que só conservou graças à boia que o Partido Comunista Francês lhe atirou, mais interessado em manter sua liderança nas entidades sindicais do que em fazer a revolução. 
...que parece ter esquecido totalmente o próprio passado.

Merecidamente, ao agir como fura-greves da nova Comuna de Paris (são marcantes as semelhanças entre o que propunham communards de 1871 e a pauta de seus congêneres de 1968, ambas, aliás, inspiradíssimas!), o PCF se condenou à insignificância. Os franceses não são tão condescendentes com relação às atuações desastrosas de seus partidos quanto os esquerdistas brasileiros...

E, nas manifestações contra o capitalismo e suas mazelas que vêm marcando a década atual, incluindo as jornadas de junho de 2013 no Brasil, a pulverização da vanguarda é uma característica comum. Não há força majoritária da esquerda as convocando e conduzindo, mas uma imensidão de células independentes imantadas pelas redes sociais.
Este título se revelará profético?

Fazem lembrar as ondas revolucionárias que, segundo Marx, varreriam o mundo. Dá para imaginarmos que, com a agonia capitalista chegando ao ponto decisivo, uma crise do tipo da imobiliária de 2007/2008 possa não só evoluir para um clash como o de 1929, mas também gerar uma reação da sociedade equivalente à Primavera de Paris.

Concordo com Zuenir Ventura: 1968 não terminou. Os fios da História poderão até ser reatados meio século depois, por que não?"

4 comentários:

Valmir disse...

e agora como então, como disse Godard, é realmente um luta de proletários contra burgueses.
estudantes/burgueses versus policia/proletária.

celsolungaretti disse...

O Godard parece o Glauber Rocha: fez filmes incríveis durante certo tempo, mas chegou um momento em que a fonte secou e nada mais prestou.

É patético que o diretor de A CHINESA tenha dito uma frase tão na linha das posições caducas do PCF. Foi capaz de antever o que aconteceria... e depois ficou contra!

Como fui crítico de cinema e de música, essas incoerências não me surpreendem. Nunca esperei coerência ou sapiência do que essa gente fala.

Valmir disse...

acontece o seguinte: com a idade (vivencia, conhecimento do mundo, maturidade, experiencia, leituras e informação) a gente vai da esquerda pra direita,,,,nunca... (talvez com a unica exceção de dom Helder Câmara) o contrario.

celsolungaretti disse...

Traduzindo: as pessoas perdem o idealismo, acomodam-se e passam a priorizar apenas a si próprias.

Lá pelos meus 15 anos eu já comecei a perceber que ser um bom ganhador de dinheiro e obter os bens ambicionados pela classe média não era uma perspectiva satisfatória para mim. Queria mais. Não sabia direito o que, mas tinha certeza de que não era o que meus colegas da escola e do bairro queriam.

Durante uns dois anos me fascinei com o existencialismo de Sartre e Camus. É até interessante a ideia de que, em cada uma de nossas opções, estamos escolhendo caminhos e nos construindo de uma ou outra maneira.

Mas, acabei chegando à conclusão que não era uma saída individual o que eu buscava. Percebia que não havia felicidade possível em meio a tanta pobreza de lado e a tanto desperdício de esforços do outro. A competição zoológica a que o capitalismo tange as pessoas me parecia coisa de animais. Como diz a música do Vandré, com gente tinha de ser diferente.

Então, quando acabei tomando conhecimento do marxismo, encontrei a perspectiva que procurava na vida. Para mim não foi um modismo, como para tantos que seguiram na onda e hoje se percebe que não tinham nada a ver com o que 1968 representou.

Meio século depois, no que realmente importa, não mudei. Continuo acreditando que não só a felicidade da espécie humana, como também (agora que o quadro se deteriorou tanto) a sua perpetuação, depende da união de esforços em prol do bem comum.

Estatização da economia e ditadura do partido único não fazem parte da essência do marxismo nem do anarquismo. Foram meros acidentes de percurso, explicáveis pelo fato de que a construção do socialismo jamais foi tentada segundo suas premissas teóricas: a suposição de Marx foi sempre que, como o capitalismo, ele se implantaria num número considerável de nações, as mais pujantes em primeiro lugar e as outras acabando por segui-las.

Mas, os bolcheviques resolveram tomar o poder no país mais atrasado da Europa, acreditando que seria o estopim para a ocorrência de outras revoluções. Resultado: não houve a sonhada onda revolucionária e a URSS ficou sozinha, hostilizada, boicotada e invadida pelas nações capitalistas; e, como nela não existia a infra-estrutura básica de uma nação moderna, esta teve de ser implantada a ferro e fogo, pois era evidente que, mais dia, menos dia, haveria guerra contra a Alemanha nazista.

Enfim, foi uma tragédia histórica. E outra tragédia histórica é que o capitalismo esgotou sua vida útil sem ser substituído por uma organização superior da sociedade. A última vez que isto aconteceu, no fim do Império Romano, o resultado foi a barbárie. E hoje salta aos olhos que nos encaminhamos novamente para a barbárie, ou coisa pior ainda.

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