terça-feira, 26 de dezembro de 2017

ESTAMOS EM PLENA ERA DOS RETROCESSOS SOCIAIS – parte 1

Por Dalton Rosado
Os últimos milênios foram marcados pelo escravagismo, que proporcionava a alguns poucos uma vida confortável dentro das possibilidades que o domínio do saber lhes facultava; e, para a grande maioria, uma vida miserável. 

Desde o Império Romano, tanto as fazendas como os poucos núcleos urbanos eram divididos em castas sociais: de um lado, os senhores donos de terras e títulos nobiliárquicos; do outro, os escravos, a grande maioria populacional. 

Na Roma antiga, a grande cidade do mundo ao tempo do nascimento de Jesus Cristo, viviam cerca de 1 milhão de habitantes, com 80% da população sendo escravos que tudo faziam; aos senhores cabia o domínio e exercício das artes, da cultura e do prazer. 

Paulatinamente foram surgindo os burgos (daí a origem da palavra burguesia para designar a nova casta social que se formaria lentamente), feiras de comércio nas quais os servos tinham a possibilidade de trocar seus poucos produtos, praticando-se o escambo com o auxílio de uma mercadoria eleita como equivalente geral, até surgirem moedas que passaram a servir como dinheiro. 

Tudo parecia uma decorrência natural da evolução social. Nem de longe se percebia que se tratava de uma nova forma de relação social, a qual ensejaria uma nova forma de escravagismo (a coerção tácita da forma-valor) que lentamente substituiria a escravidão direta então existente.
A escravidão se tornou antieconômica...

O processo de escravidão direta permaneceu até há pouco tempo (a abolição da escravidão negra do Brasil se deu oficialmente em 1888), quando se processavam, concomitantemente, relações feudais e pré-capitalistas, até desembocarmos nas relações de produção capitalistas desenvolvidas (ainda que subsista, em muitos países, bolsões de trabalho escravo, também encontrado em várias áreas rurais brasileiras).

O sistema produtor de mercadorias necessitava cada vez mais do trabalho abstrato produtor de valor; os humanos, transformados em animais de carga escravizados, já não preenchiam adequadamente tal função. 

Assim, aboliu-se a escravidão como estatuto jurídico vigente até então (o que bem demonstra o verdadeiro e abominável caráter histórico do direito como ideal de realização de justiça) e os homens tornaram-se livres para a venda ao capital da única mercadoria que possuem: a sua força de trabalho. 

Esse é o leitmotiv da revolução burguesa republicana que pareceu, no primeiro instante, estar abrindo caminho para a concretização da igualdade, liberdade e fraternidade, mas que, na prática, representou:
...e as promessas da revolução burguesa não se cumpriram.
 um fator de indução a guerras tais quais jamais a humanidade sofrera, com genocídios em massa como nas duas guerras mundiais em que morreram de 60 a 70 milhões de pessoas, entre civis e militares; 
— o agravamento da miséria social para contingentes humanos marginalizados no processo de produção de mercadorias como jamais existiu na humanidade, ao mesmo tempo em que produziu um volume de riqueza abstrata concentrada nunca antes existente; 
— uma destruição das riquezas naturais não renováveis e agressão ecológica como jamais houvera;
— a imposição de um processo de socialização negativo à esfera global, com os indivíduos sociais sendo tratados como mônadas do interesse abstrato do valor, contrapondo-se uns aos outros como adversários numa competição autofágica.  
Ilusões de progresso: bolhas que logo estouraram.
Mas, se o itinerário da implantação pretensamente libertária do capitalismo foi lastreado pelo sangue humano derramado pela força das armas, podemos considerar que, ainda que pari passu à miséria generalizada, criaram-se alguns bolsões nacionais de riqueza abstrata onde foram possíveis as conquistas de direitos sociais que serviram de exemplos mundiais a serem seguidos, como se tudo fosse apenas uma questão de boa administração pública, competência e trabalho, trabalho, e mais trabalho. 
   
Constituindo-se, contudo, o capitalismo numa contradição em processo (ou seja, uma grande bolha de produção de progressiva, cumulativa e concentrada de riqueza abstrata que mais cedo ou mais tarde iria estourar, demonstrando a sua insustentabilidade como modo de produção social), eis que agora atingimos a curva de declínio de sua ascensão heterogênea. 

Graças à introdução da microeletrônica que potencializou a aplicação da tecnologia da robotização, computação e informação instantânea via satélite à produção de mercadorias, eliminando em maior parte o trabalho abstrato, único produtor de valor, vivemos o momento das perdas generalizadas de direitos sociais antes conquistados nos países industrialmente desenvolvidos e na completa desintegração dos países periféricos do capitalismo. 
Resumo da ópera

Vejamos alguns exemplos que pontificam no noticiário mundial, deixando atônitos os donos dos PIB's mundiais e seus representantes políticos, ao mesmo tempo em que priva a esquerda institucional (aquela que positiva o modo de produção capitalista estatal ou privado) do seu referencial de bandeiras históricas equivocadas, agora evidenciadas como anacrônicas.
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A QUESTÃO PREVIDENCIÁRIA
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Não há fórmula atuarial que encontre equilíbrio financeiro para resolver o problema do déficit previdenciário senão cortando benefícios aos que, durante anos e anos de trabalho abstrato, contribuíram para a garantia de um futuro cômodo quando as suas forças físicas já não permitissem a produção de valor pelo mesmo trabalho abstrato produzido na juventude. 

É que a fórmula de seguro previdenciário sempre se sustentou no aumento de contribuintes jovens como forma de manutenção ou melhora das pensões previdenciárias dos idosos. Alguns contribuem com parte dos seus salários para os pagamentos dos que já não podem trabalhar.

Assim, no momento de desemprego estrutural (no Brasil atingimos o patamar de 13% da mão de obra economicamente ativa), e que fustiga com mais intensidade os jovens que chegam ao mercado de trabalho, ocorre uma impossibilidade matemática-financeira de pagamento das pensões previdenciárias nos padrões anteriormente praticados, obrigando os administradores públicos e privados à redução dos déficits previdenciários mediante a diminuição do valor dessas mesmas pensões previdenciárias. 

Se tal fenômeno já atinge países de economias fortes como a França, Inglaterra e alguns outros do mesmo naipe, imagine o que ocorre nos países onde a economia está vivendo um processo de estagnação provocado pelo baixo nível de produtividade de mercadorias, impedindo-os de participarem da corrida concorrencial de mercado?

Nesse sentido, os governos de direita, como o do Presidente Temerário, compromissado com os donos do PIB e sua exigência de manutenção estrita da ordem capitalista, impõem ao povo brasileiro os sacrifícios próprios ao ajuste financeiro fratricida das contas públicas. Trata-se de um ato político-administrativo tão previsível quanto condenável. 

Mas, para quem se propõe a superar o capitalismo e suas mazelas, de que adianta administrar o que somente pode ser administrado a partir do retrocesso representado pela perda crescente e inevitável de direitos em razão de uma lógica de mediação social que, irremediavelmente, faz água por todos os lados?
O problema previdenciário não tem solução possível sob o capitalismo se o desenvolvimento econômico estiver declinando. 

E está! Trata-se de uma tendência ora irreversível, embora os súditos kamikazes do capitalismo continuem tentando revertê-la, cegos às evidências de que estão apenas dando murros em pontas de faca.

(continua aqui)

4 comentários:

Unknown disse...

Existe uma Lei chatinha expressa na razão população/recursos, que comanda a natureza.

Essa insensível relação impõe mecanismos de controle populacional toda vez que o resultado é maior que 1.

E me parece que dar murros em ponta de faca é vociferar contra a Lei.

Lei mesmo. Que não pecisa de coerção para ser obedecida.

Toda vez que a razão aproxima-se ou for maior do que 1, haverão fatores deletérios que diminuirão a população.

O resto é sonho.

Se os seres humanos fossem realmente Humanos e se guiassem pela Razão entenderiam a Lei e cuidariam para que a razão (população/recursos) ficasse sempre abaixo de 1 por meio de práticas pacíficas de controle populacional e alocação de recursos.

E teríamos quase um paraíso na terra.

Valmir disse...

o comentarista acima tocou no único ponto que realmente importa ...contingente humano x recursos e espaços; mas isso, (controle populacional) é o maior tabu para as esquerdas em geral e igrejas e religiões...justamente pq tais organismos tiram toda sua força das legiões de miseráveis que penam pelo mundo mendigando esperança que é falsamente provida pelos dois tipos de farsantes...difícil saber qual mais nefasto.

celsolungaretti disse...

Caro Sady,

concordo que existe um limite populacional e de recursos naturais para o Planeta Terra num ponto futuro. Entretanto, entendo que estamos muito longe de atingirmos esse limite. A densidade demográfica em regiões continentais como a América do Sul, Oceania e até mesmo a Europa e a Eurásia ainda é muito baixa.

O que está a correr é que vivemos sob uma lógica de produção contraditória e irracional que agora atingiu o seu limite interno de expansão e agressão ecológica e clama por superação.

Com o saber tecnológico adquirido pela humanidade poderíamos suprir todas as nossas necessidades de consumo comodamente e de modo sustentável, e ainda eliminando o consumismo desenfreado e supérfluo provocado pelo capitalismo e sua necessidade de expansão perante os poucos que podem consumir.

É assim que penso.

Um abraço e feliz ano novo. Dalton Rosado

Anônimo disse...

Tambem acho que deveriamos levar em consideração e muito a sério o fator "nascimento planejado". Com terras trabalhadas com veneno e que mais a frente nos trara enfermidades. Para uma alimentação saudavel deveria ser repensado o tal de "Agro negocio"

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