quarta-feira, 27 de setembro de 2017

UM E OUTRO

Toque do editor
Serei sincero: em dia de noticiário morno, eu não encontrava nenhum assunto que me me animasse a ponto de trazê-lo para o blogue. Aí bati os olhos no artigo Dirceu e Palocci, do Bernardo Mello Franco, que tem lá seu interesse, mas não é nada tipo parem as rotativas!, como se dizia nos tempos de antanho...

Veio-me, contudo, a ideia de estabelecer um paralelo com uma das melhores canções pouco lembradas do Chico Buarque, Umas e outras. Aí, minhas dúvidas se dissiparam: é com este que eu vou!

De resto, tais personagens inspiram-me sentimentos contrários, mas não exatamente os mesmos dos petistas.

Considero que, na escala de valores dos revolucionários, foi um pecado mortal o ex-trotskista Antonio Palocci ter usado todo o peso do podre Poder Executivo para detonar um humilde caseiro; afinal, existimos para fazer desses coitadezas os sujeitos da História, não para os esmagar quando atrapalham ministros do nauseabundo Estado atual. Face às desgraças e ao opróbrio do Palocci, só consigo pensar que Deus talvez escreva mesmo certo por linhas tortas...
O trotskista que virou suco (ou muco)...

Já o Zé me decepcionou profundamente quando se reuniu em 2002 com grandes  empresários (melhor seria dizer salafrários...) para acertar os termos da capitulação do Lula aos inimigos de classe. Mas, não me iludo: era exatamente esta a missão de que o ex-metalúrgico o incumbiu. 

Foi apenas um representante correto do representado. O grande erro tinha sido cometido lá atrás, quando se inchou tanto a bola de quem não queria o fim da exploração do homem pelo homem, mas, tão-somente, um aumento da quantidade de migalhas do banquete dos exploradores que iam para a mesa dos explorados.

Quanto à contribuição pessoal que o Zé deu para o mar de lama, deve ser relativizada: o mar de lama sempre existiu (inclusive durante as duas longas ditaduras do século passado) e sempre foi amplo, geral e irrestrito, com a imprensa canalha fechando os olhos a ele ou alardeando-o ao máximo, ao sabor de suas conveniências em cada momento político.

O velho Zé deveria saber: aquilo que todos fazem impunemente numa democracia burguesa, um revolucionário ou ex-revolucionário não pode imitar sem que o mundo desabe sobre sua cabeça. Lamento, sobretudo, o monumental trunfo que ele forneceu para a propaganda adversa.
...e o antigo companheiro que jamais deveria ter dado tanta sopa pro azar.
De resto, jamais me omitirei quanto ao fato de que as penas aplicadas ao Zé excedem em muito a gravidade dos crimes que lhe atribuem. 

Aos 71 anos de idade, deveriam permitir-lhe passar o que lhe resta de vida com a família, discretamente, como tem feito nos últimos tempos. Eles punem por corrupção, mas o ódio incontido se deve ao fato de o Zé ter sido um dos personagens mais emblemáticos das jornadas de 1968. 

Eis o artigo:

"José Dirceu e Antonio Palocci foram os aliados mais importantes de Lula na eleição de 2002. O primeiro montou a aliança que tirou o PT do gueto da esquerda. O segundo negociou a trégua entre o partido e o empresariado.
Lembram-se das antigas campanhas contra armas? "Hoje mocinho, amanhã bandido"...
Depois da vitória, os dois foram recompensados com os principais cargos do novo governo. Dirceu passou a pontificar na Casa Civil como um primeiro-ministro. Palocci assumiu a Fazenda com carta branca para comandar a política econômica.

No período da bonança, Lula não poupava elogios para afagá-los. O ex-líder estudantil, que pegou em armas contra a ditadura militar, virou o capitão do time. O médico de Ribeirão Preto, que não parecia ter intimidade com a bola, foi comparado ao craque Ronaldinho Gaúcho.
Zé Dirceu foi um dos personagens mais emblemáticos de 1968

Depois viria a tempestade, e o chefe lançou os auxiliares ao mar. "Eu afastei o Zé Dirceu, afastei o Palocci, afastei outros funcionários e vou continuar afastando", disse, durante a campanha à reeleição em 2006.


Nesta terça, os ex-ministros voltaram a se cruzar no noticiário. Dirceu, que cumpre prisão domiciliar, teve a pena aumentada para 30 anos de prisão. Palocci, que negocia um acordo de delação premiada, anunciou a decisão de se desfiliar do PT.

Condenados por corrupção, eles escolheram caminhos opostos. Dirceu manteve o silêncio em nome da causa. Arrisca passar o resto da vida preso, mas é tratado como herói pelos antigos companheiros. Palocci deve voltar mais cedo para casa, mas jamais se livrará da pecha de traidor.

Muito antes da Lava Jato, os dois chegaram a ser cotados para suceder Lula no Planalto. Então vieram o mensalão e o escândalo do caseiro, e a candidatura sobrou para Dilma Rousseff. Mas essa já é outra história. (por Bernardo Mello Franco)

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