segunda-feira, 20 de fevereiro de 2017

A ÉPOCA DE OURO DA MPB (final)

INÚTIL E AGÔNICA BUSCA DO APOGEU PERDIDO
(continuação deste post)
No 7º FIC (1972), o amargo fim: artistas demais e talento de menos no palco.
N4º Festival da Música Popular Brasileira, que a Record realizou em outubro/novembro de 1968, a censura já dava as cartas, toda poderosa. Tom Zé, p. ex., teve de trocar os versos "o empregador que condena/ um atentado por quinzena" (referência a ações armadas) por "o pregador que condena/ um festival por quinzena"!!!

Como novidade, houve duas relações de premiados.

júri especial (críticos e artistas ilustres) escolheu "São, São Paulo, meu amor", de Tom Zé, seguida de "Memórias de Marta Saré" (Edu Lobo/Gianfrancesco Guarnieri), "Divino Maravilhoso" (os autores Caetano e Gil, até em razão da má experiência com o FIC, cederam a música e o palco para a tímida Maria das Graças se metamorfosear na agressiva Gal, sob óbvia influência de Janis Joplin), "2001" (Tom Zé/Rita Lee) e "Dia da Graça" (Sérgio Ricardo).
Melhores momentos da final do 4º festival da Record 
.
"Marta Saré" também foi vice na votação popular, enquanto o tributo sarcástico de Tom Zé a São Paulo ficou apenas em 5º lugar.

O povo preferiu a xaroposa "Bem-vinda", outra canção convencional e atemporal que Chico Buarque compôs no ano de maior efervescência política e cultural da nossa história recente.

Em 3º, uma curiosa parceria entre Ary Toledo e Chico Anísio, para enaltecer o clã dos Kennedys: "A Família".

O 4º foi para "Bonita", estranha guarânia de um Geraldo Vandré que parecia pressentir a tragédia que se abateria sobre ele.
Inacreditavelmente, a magnífica "Sentinela", de Milton Nascimento, não entrou em nenhuma das listas. Talvez porque o júri especial soubesse tratar-se de (e temesse premiar) um tributo velado a Che Guevara, enquanto os cidadãos comuns o ignoravam...

No 4º FIC, em setembro de 1969, vitória de "Cantiga para Luciana", de Edmundo Souto e Paulinho Tapajós.

Nas colocações seguintes, outras musiquinhas rasteiras.

E pensar que concorriam "Gotham City" (Macalé/Capinan), "Ando Meio Desligado" (Mutantes) e a antológica "Charles Anjo 45" (Jorge Ben)!!! Os juris continuavam sendo simpáticos, mas incompetentes...
5º FIC, em outubro de 1970, lançou Ivan Lins (2º lugar, com "O amor é meu país", dele e Ronaldo Monteiro) e Gonzaguinha (4º, com "Um abraço terno em você, viu, mãe".

Sueli Costa ficou em 3º, com "Encouraçado", dela e Tite Lemos.

E quem venceu, acreditem, foi a intragável "BR-3", de Antônio Adolfo e Tibério Gaspar, projetando Tony Tornado – cuja carreira principal logo se tornaria a de ator coadjuvante em pornochanchadas.

No 6º FIC, setembro de 1971, os artistas mais renomados tramaram um protesto contra a censura, que ocorreria quando o festival estivesse sendo transmitido ao vivo para o Brasil e outros países.
A TV Globo ficou sabendo (espalhou-se, com base em mera suposição, que o delator teria sido o Wilson Simonal, por ter agentes subalternos da repressão como companheiros de farras) e, inviabilizada a surpresa, os grandes nomes retiraram em bloco suas composições.

Vitória de "Kyrie", de Paulinho Soares e Marcelo Silva.

A 3ª colocada, "Desacato", da dupla Antonio Carlos e Jocafi, foi a única que emplacou em termos comerciais. Artisticamente, nenhuma.

Finalmente, no 7º FIC, setembro de 1972, a TV Globo teve de destituir o júri para premiar sua preferida, "Fio Maravilha", de Jorge Ben, com Maria Alcina.
Fim de feira apropriado para um ciclo que, na verdade, tinha terminado em dezembro de 1968, quando o Ato Institucional nº 5 impôs ao País a paz dos cemitérios, sufocando as energias criativas dos artistas, que não puderam mais cumprir seu papel de antenas da raça.

Melancólico, o derradeiro FIC deixou, pelo menos, uma semente: "Cabeça", de Walter Franco, lançou o experimentalismo pós-tropicalista que vicejaria nos anos seguintes, com ele próprio, Jards Macalé, Jorge Mautner, Hermeto Paschoal, Naná Vasconcellos, Wagner Tiso, Arrigo Barnabé e Itamar Assumpção, entre outros.

Epílogo – Em termos artísticos a era dos festivais se encerrara no final de 1968, com a assinatura do AI-5; o que teve fim em 1972 foi a sequência de eventos anuais que se iniciara em 1965. Daí em diante, pipocariam esporadicamente tentativas de retomada, mas estas serviram apenas para confirmar que aquela página tinha sido mesmo virada.

Uns poucos resquícios da época de ouro da MPB ainda se notariam no Festival Abertura da TV Globo (fevereiro/1975), cuja vitória coube à esquecível e esquecida "Como um ladrão", de Carlinhos Vergueiro. Marcantes foram, isto sim, a partida de dados que Walter Franco e o maestro Júlio Medaglia fingiram estar jogando, enquanto o público vaiava histericamente "Muito tudo"; e Alceu Valença despontando para o estrelato com "Vou danado pra Catende".

E também no Festival 79 da Música Popular, que a TV Tupi promoveu quatro anos mais tarde – até porque Walter Franco, com sua blueseira e contundente "Canalha", recebeu nova vaia digna de Sérgio bom de bola Ricardo e de Caetano Cohn-Bendit Veloso.

O júri igualmente bisou a crassa incompetência dos congêneres de outrora, dando a vitória à banal "Quem me levará sou eu" (Dominguinhos/Manduka), quando imensamente melhores eram a própria "Canalha", "Bandolins" (Oswaldo Montenegro") e "Sabor de veneno" (Arrigo Barnabé).

Depois, nem isto. Os MPB Shell de 1980, 1981 e 1982, bem como o Festival dos festivais de 1985, foram meras irrelevâncias. Nada sobrara do boi para a TV Globo faturar mais uma graninha, nem mesmo o berro...

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