terça-feira, 12 de outubro de 2010

LARANJAS MECÂNICAS NÃO PRODUZEM NÉCTAR

O binômio pesquisas/marqueteiros dá a tônica da atual eleição presidencial.

Lemos nos jornais que Dilma Rousseff foi mais agressiva no debate de domingo porque assim o decidiram os estrategistas de sua campanha.

Agora, eles esperam ansiosos o resultado das pesquisas, para aferirem se funcionou.

Caso o retorno seja ruim, é provável que ela reassuma o figurino de  Dilminha paz & amor.

Caso seja bom, farão a sintonia fina.

Só vejo dois problemas nessa calibragem de campanhas eleitorais como se fossem telenovelas, que vão sendo adequadas semana após semana à sensibilidade do público-alvo (com personagens antipáticos tendo seu peso reduzido ou sumindo de cena, enquanto os personagens simpáticos vão ganhando mais destaque):
  • deixamos de ter verdadeiros políticos, com verdadeira sensibilidade política, substituídos por atores capazes de seguir o script que lhes impõem em cada momento;
  • a política vira espelho do eleitorado, de seus humores e de suas limitações, não mais o conduzindo, mas sendo por ele conduzida.
Para quem quer que tudo fique como está, ótimo. É um universo fechado em si mesmo e incapaz de gerar uma transformação estrutural.

Para quem quer revoluções, péssimo. Pois elas sempre foram produzidas por contingentes com maior amplitude de visão e mais ousadia, que captam a necessidade de uma mudança drástica e acabam arrastando a maioria modorrenta, que por inércia prefere ficar parada e, ainda por inércia, vai continuar se movimentando depois que colocada em movimento.

A campanha de Dilma evita cuidadosamente a caracterização do confronto como ideológico -- campo progressista x campo reacionário. Mantém-se no terreno da política oficial e convencional, criticando o inimigo em detalhes com as privatizações, mas não na sua essência.

Já os demotucanos, na internet, reutilizam sem freios de nenhuma espécie os velhos espantalhos do anticomunismo, deixando suas brigadas virtuais municiarem-se à vontade nos sites fascistas.

Tudo que as viúvas da ditadura e seus filhotes inventavam sobre os antigos resistentes em geral, agora é assacado contra Dilma, com a mesmíssima desonestidade intrínseca, característica dos falsários mais abjetos.

Por quê?

Porque a satanização dos descontentes com o capitalismo vai ao encontro da visão de mundo dos grãos senhores do poder econômico, mesmo que eles a considerem excessiva e desnecessária neste momento. Então, os demotucanos podem apelar para os pitbulls sem ônus -- e o fazem.

Já o PT assumir francamente o confronto ideológico assustaria aos que a ele se aliaram em 2002, quando deu garantias explícitas ao grande capital de que seria bem comportadinho caso lhe permitissem assumir o poder.

Mas, o  Lula-lá  chegou bem próximo da vitória em 1989. Agora, com a popularidade do ícone-mor nas nuvens, poderia, sim, vencer com seus valores mais autênticos e não na versão domesticada de  Lulinha paz & amor.

Tudo indica, entretanto, que continuará obediente às diretrizes dos marqueteiros, enquanto as pesquisas não detonarem um alerta vermelho.

Só na iminência da derrota, como última cartada, voltará a trilhar os caminhos perigosos da luta de classes -- que, no entanto, são os que conduzem a uma vitória capaz de tornar a vida dos brasileiros realmente digna de ser vivida.

Ainda assim, o risco é grande demais para os revolucionários conscientes brincarmos com fogo. Um triunfo demotucano poderá ter consequências trágicas, abrindo caminho para um retrocesso bem maior do que hoje parece plausível.

P. ex., caso Serra tenha algum impedimento e seu vice assuma. Aonde nos levaria tal programa de índio?

O certo é que, na eleição de 1962 para o governo de São Paulo, ninguém previa consequências catastróficas quando o janismo se dividiu em duas candidaturas, abrindo caminho para a vitória do conservador Adhemar de Barros, que noutras circunstâncias seria mais uma vez sovado nas urnas.

No entanto, Adhemar teve influência decisiva no golpe de 1964, que talvez nem sequer fosse tentado na eventualidade de não contar com o apoio do governador do Estado economicamente mais poderoso.

Então, o caminho me parece bem claro para a esquerda revolucionária: cerrar fileiras com Dilma contra Serra em quaisquer circunstâncias, mas torcendo e trabalhando para que sua vitória venha a gerar um impulso transformador, não representando apenas a continuidade das políticas cautelosas que Lula adotou no cumprimento fiel dos compromissos firmados em 2002.

2 comentários:

Fábio disse...

Celso, estou desanimado. Está em curso no Brasil uma verdadeira cruzada conservadora, inclusive resgatando algumas das mais abjetas estratégias e táticas sujas que foram usadas no pré-64. Some-se a isso o aparecimento de um assustador fanatismo religioso, com alguns idiotas e inocentes úteis servindo de massa de manobra para essa escalada conservadora. Já renovei meu passaporte porque temo que dias sombrios virão.

Anônimo disse...

Parabens Celso, Penso que neste momento é muito importante a uniao de todas as forças de esquerda no sentido de combater essa ameça grave que se tornou ao pais a eleiçao de Jose Serra. Acredito que todas as forças progressistas, mas principalmente a sociedade brasileira tem muito a perder e muito a se arrepender caso isso aconteça. Somente espero que realmente todos esses setores de esquerda, tenham, a mesma lucidez que vc. Saudaçoes comunistas

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