segunda-feira, 7 de setembro de 2009

O STF JULGARÁ OU LINCHARÁ BATTISTI?

A recém-divulgada Uma Breve Análise do Caso Battisti, do professor da Unicamp e membro da Anistia Internacional dos EUA Carlos Luzardo, relaciona vários procedimentos incorretos e suspeitos do Supremo Tribunal Federal no encaminhamento do Caso Battisti, inclusive o de não estar levando em conta sua prescrição.

Também é citada a inacreditável afirmação proferida pelo presidente do STF Gilmar Mendes ao ser sabatinado pelo jornal Folha de S. Paulo, de que a decisão do Supremo extinguiria a possibilidade de apelo à clemência do presidente Luiz Inácio Lula da Silva -- uma derrapada tão desastrosa que Mendes nunca mais a repetiu, pois implicitava prejulgamento do caso, concordância prévia da maioria dos ministros com uma pretensão aberrante e a usurpação de uma prerrogativa do Executivo pelo Judiciário.

Às vésperas da apreciação no STF do pedido de extradição formulado pelo governo Berlusconi marcada para esta 4ª feira (9), é recomendável que todos leiam e reflitam (principalmente os ministros do STF, sobre os quais pesa a responsabilidade de resgatar a credibilidade da instituição, abalada por decisões polêmicas e pelas sucessivas declarações estapafúrdias que Mendes faz à mídia):
"A Itália pediu e obteve o privilégio de não ser apenas litigante, mas também parte da acusação: uma espécie de Ministério Público de Ultramar. Um fato insólito que, até onde eu pude pesquisar em processos internacionais, não possui antecedentes, é que o relator do processo, Cézar Peluso, consultou ao governo de Itália sobre todos os pedidos da defesa de Battisti, especialmente os relativos a sua liberdade. Curiosamente, o relator acatou servilmente as 'decisões' da Itália, salvo uma.

O judiciário brasileiro violou no caso Battisti todas as garantias judiciais estabelecidas na Convenção Americana Sobre Direitos Humanos (CADH).

A CADH reitera o antigo direito de que toda pessoa deve ser considerada inocente, até que sua culpabilidade seja provada. Entretanto, em declarações feitas à mídia, membros do STF fizeram insistente alarde de que o destino de Battisti seria a extradição. Um dos argumentos foi que a jurisprudência seria modificada com essa finalidade.

No caso do Brasil, a jurisprudência sobre direito de asilo, refúgio e extradição para ações políticas tem sido (...) favorável ao acolhimento do perseguido. Se houvesse causas fundadas, ela poderia ser alterada através de um processo demorado que exigiria grande consenso e fundamentação. Como se trata da tradição jurídica mais importante do Brasil, sua rejeição só poderia justificar-se com base numa mudança radical da sociedade brasileira. É insano pensar que a aparição de apenas uma pessoa pode produzir essa mudança!

Mas, em 02/2009, o ministro do STF Celso de Melo admitiu publicamente a existência de um “truque” (obviamente, ele não o chamou assim) para condenar a Battisti, mudando a jurisprudência “de medida” para o caso Battisti. Veja um dos muitos sites que reproduzem esta notícia.

Este infame comentário, enfeitado com algumas divagações filosóficas, é uma amostra muito clara de que Battisti está sendo tratado previamente como culpado.

A mesma atitude foi adotada pelo presidente do STF, Gilmar Mendes, ao advertir que o Governo deveria acatar a ordem de extradição, caso o STF se declarasse a favor dela.

Outra cláusula da CADH violada pelo STF no caso Battisti é a exigência de que toda pessoa possa apresentar petições respeitosas que devem ser respondidas pelas autoridades. Battisti pediu durante muito tempo o direito a ser escutado pelo Tribunal. Inclusive, o prestigioso senador Eduardo Suplicy (...) se dirigiu no dia 11 de fevereiro ao STF informando de que o réu tinha redigido uma declaração que gostaria fosse lida pelos magistrados. Entretanto, essa petição (que não poderia ter sido mais respeitosa) não teve resposta.

Ainda mais grave é a violação de um princípio da CADH que afirma que todo preso tem direito à verificação da legalidade de sua prisão, e a ser julgado sem demora ou, então, a ser liberado. A justiça brasileira não se incomodou com verificar a legalidade da prisão de Battisti. De fato, ele estava detido sem acusação concreta nenhuma, no melhor estilo das detenções da época da ditadura. Obviamente, não pode aduzir-se a periculosidade do réu, já que em 28 anos de exílio, todas as testemunhas de sua vida, e não apenas os amigos, coincidiram em sua total adaptação as leis dos lugares que habitava.

Quando Battisti seja julgado, terá havido uma demora de 'apenas' 30 meses.

Inclusive o procurador geral da República (...) foi bastante consistente ao propor o arquivamento do pedido de extradição, e considerar que a atitude do ministro Genro tinha sido juridicamente correta. Ou seja, a prisão de Battisti, além de uma gentileza ao sadismo dos fascistas itálicos, é um ato injustificado que viola claramente a CADH.

Em 13 de março de 2009, os advogados de Battisti apresentaram seu quinto pedido de liberdade para o refugiado, se baseando agora no fato de que o processo está prescrito, pois já se passaram 20 anos desde a data em que ele foi condenado.

O governo italiano se manifestou contra o pedido com extrema rudeza, acusando aos advogados de má fé, de desonestidade profissional e de outras injúrias pesadas, e acabou negando que uma pena de prisão perpétua tenha prescrição. No entanto, mesmo nos casos mais iníquos, o país asilante é que deve decidir isso de acordo com suas próprias leis. Isto acontece inclusive nas sociedades com processos penais arbitrários e autoritários, como o Paquistão. Portanto, Brasil deve ter em conta que a pena máxima a que Battisti poderia ser condenado se fosse extraditado, seria de 30 anos. Nesse caso, o processo correspondente prescreve aos 20 anos.

Um hábito do relator do caso Battisti é contrário a ambos, aos direitos humanos do preso e à autonomia do Estado Brasileiro. É a sua subserviência superlativa e sua cumplicidade com os acusadores. Não é exagerado dizer que, excluindo países onde o direito é absolutamente arbitrário (como as teocracias islâmicas, p. ex.), é difícil encontrar um caso comparável. Pode pensar-se que o governo italiano está julgando Battisti usando os magistrados brasileiros como simples procuradores."

8 comentários:

Anônimo disse...

Um artigo também mostrando pontos do excelente texto produzido por Luntarzo:

Caso Battisti: uma breve e fundamental análise
http://passapalavra.info/?p=11455

Unknown disse...

Infelizmente, jurisprudência no Brasil tem pouca serventia. É o positivismo jurídico que "comanda esse trem". Temos muito que evoluir...

celsolungaretti disse...

Não dá para esperarmos essa evolução, Clau. Passamos por um momento decisivo. A hora de confrontar a direita togada é agora.

leonardo abel disse...

São lúcidas as ponderações sobre a similitude entre o caso Battisti e o que envolveu o episódio conhecido com a “La Tablada” na República Argentina (Ext. nº 493 / Argentina), este, inclusive em pleno Estado Democrático de Direito - poderia acrescentar, dentre outras inúmeras, as tradicionais posições adotadas pelo Supremo Tribunal Federal por ocasião da análise da da Extradição nº 974 / ITÁLIA / Pietro Mancini – Relator o Ministro Marco Aurélio da Extradição nº 794 / Lino Oviedo - Relator o Ministro Maurício Correa, da Extradição nº 581 / ITÁLIA / Achille Lollo, Extradição nº 446 / Haiti / Albert Pierre - Relator o Ministro Célio Borja (esta última, inclusive, contanto com precioso parecer do então Procurador Geral da República, Dr. Sepúlveda Pertence ), TODAS elas, independendo do pensamento político do perseguido penalmente pelo Estado Estrangeiro julgadas e, a unanimidade, INDEFERIDAS pela Suprema Corte Brasileira.

leonardo abel disse...

Ocorre, ainda, que, se perplexidade maior provoca a inusitada revisão - e inimaginável ANULAÇÃO, presente as leis de regência e nossa NAÇÃO revelada como um ESTADO DEMOCRÁTICO DE DIREITO, de um ato eminentemente político e soberano reservado ao Executivo da República do Brasil - como a toda evidência o constitui a concessão de asilo ou refúgio por parte do Senhor Ministro da Justiça (ato, até acaso poderia ser revogável por seu sucessor, como ocorreu no caso de François Mitterrand na França)-, na RIDÍCULA linha de raciocínio seguida pelo Relator Ministro Peluso, restou absolutamente inexplicada porque esse MESMÍSSIMO exame - a verificar a legalidade do ato - não se realizou NUNCA no Supremo Tribunal nas hipóteses de NEGAÇÃO do pedido de REFÚGIO por parte do CONARE ou mesmo de desprovimento do recurso administrativo por parte do Ministro da Justiça. ESSA TOTAL E ABSOLUTA INCONGRUÊNCIA JURÍDICA - por não lhe dar o qualificativo mais forte que largamente mereceria - FICOU EM ABERTO E BOM SERIA ADENTRAR-SE EM SUA ANÁLISE NA RETOMADA DO JULGAMENTO. No que concerne à Sessão de Julgamento efetuada no passado dia 09.09.2009, os doutos votos proferidos pelos eminentes Ministros Carmen Lucia, Eros Grau e Joaquim Barbosa marcam que ainda existe uma luz no final do túnel, nesses tempos de perda de parâmetros e de “caças as bruxas”. Por sua vez, o eminente Ministro MARCO AURÉLIO, com sua inteligência, conhecimento e intelectualidade peculiares, mais uma vez, nos fez sentir o orgulho de sermos cidadãos brasileiros!

leonardo abel disse...

Na contramão, o voto proferido pelo Ministro Cezar Peluso não ultrapassou o obscurantismo que regularmente acompanhou suas decisões e portanto não surpreendeu no mundo jurídico. Todos sabemos que ele é um “juiz” conservador que, em que pese a completar mais de 40 anos de “magistratura”, se trata de julgador despreocupado com as leis e altamente despreparado que sempre resolveu os conflitos que teve subjudice tendo fundamentalmente presente o poder de fogo das partes em litígio, sistematicamente se inclinando pelos mais fortes e ainda embasando suas vacilantes “decisões” prolatadas nos últimos anos e desde que infelizmente atua em nossa Suprema Corte - inclusive substituindo eminente técnico como o Ministro Sydney Sanches - em opiniões pessoais, pouco se importando com a Constituição Federal e o arcabouço normativo de nossa República. Preocupa, inclusive, que no muito longe no tempo, presidira o Supremo Tribunal Federal. A esse quadro, vieram a somar-se, nesse caso específico, o peculiar ÓDIO que o Ministro Cezar Peluso sempre demonstrou pelo PARTIDO DOS TRABALHADORES - até se olvidando que foi por decisão do Presidente Lula que ocupa cadeira no STF desde 2004 - e sobretudo, seu notado DESPREZO pelas IDÉIAS e a ATIVA MILITÂNCIA de ESQUERDA. Fosse MILOSEVIC quem estava no banco dos réus, teria votado pelo INDEFERIMENTO da extradição. Por outra parte, esperada também era a posição assumida pela Ministra Ellen Gracie, até mesmo porque a mesma não apenas se mostrou sempre como uma recalcitrante conservadora cujo reconhecido afã foi sempre até mesmo ocupar – o mais longe do Brasil e seus pares brasileiros - cadeira vitalícia em alguma Corte Internacional, senão que - conjuntamente com o ex-Ministro Nelson Jobim - foi a pivô e uma das principais executoras no lamentável processo de perda de parâmetros e de esvaziamento e DESTRUIÇÃO que hoje se nota no Supremo Tribunal Federal. O voto do Ministro Ricardo Lewandowski apenas se mostrou como mais um ato cinzento de um magistrado que não tem mínimas qualidades para integrar nossa Suprema Corte, considerada a história dos que lhe antecederam nesse mais Alto Tribunal .

leonardo abel disse...

Lamentável e supressiva sim - e por isso se espera até uma mudança de posicionamento no curso do julgamento -, foi a postura assumida pelo eminente Ministro Ayres Britto, que, desde que ocupa cadeira no STF, sempre se destacou por sua postura totalmente altruísta e humanitária, em favor dos mais desfavorecidos. O julgamento ainda não acabou e por isso talvez o escritor Cessare Battisti alcance a liberdade que já deveria lhe ter sido concedida há muito.tempo. Contudo, a última palavra - em relação a nossa SOBERANIA NACIONAL - será do Exmo. Senhor Presidente da República que, até para que sejamos respeitados no exterior e na ITÁLIA – onde os italianos tratam aos brasileiros como se fossemos lixo, em se esquecendo que fraternamente lhes demos comida e abrigo nas guerras -, certamente, irá CONFIRMAR a plena valia do ATO POLÍTICO do eminente MINISTRO e HONRAR a sua condição de BRASILEIRO, soltando ao extraditando perseguido pelo Governo Italiano do mediático do multimilionário premier italiano, SILVIO BERLUSCONI. Muito obrigado pelo espaço cedido. Leonardo.

leonardo abel disse...

Os que nos chamam de esquerdistas perfeitamente sabem que nossa arma superior é a força da razão e a palavra, por isso sempre tentam nos calar exterminando-nos ou jogando-nos às masmorrsas, como querem fazer com o escrito Cessare Battisti. Com feito na argneitna, onde os torturadores das distaduras do medo e do terror apodrecem na cadeia, não desistiremos até a vitória final. Liberdade a Battisti, ... Liberdade aos perseguidos políticos, e aos incansáveis lutadores pela liberdade e a fraternidade ...

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