segunda-feira, 24 de agosto de 2009

A MORAL DELES E A NOSSA

Leio na imprensa burguesa que o Supremo Tribunal Federal estaria propenso a absolver na próxima 5ª feira (27) o hoje deputado federal Antonio Palocci do crime de haver ordenado a quebra do sigilo bancário de Francenildo Costa, na esperança de obter provas de que fora subornado por seus inimigos políticos.

É que Francenildo fornecera à CPI dos Bingos detalhes sobre a participação do então ministro da Fazenda num esquema mafioso/promíscuo: caseiro da chamada "casa do lobby" de Brasília, na qual se tramavam negociatas e se faziam festas com garotas de programa, ele relatou que Palocci era frequentador assíduo do local.

Apostando em que a movimentação bancária de Francenildo registraria algum depósito vultoso nos dias que antecederam o depoimento do caseiro, Palocci ordenou ao então presidente da Caixa Econômica Federal que lhe trouxesse o extrato da conta. Isto configura violação de sigilo funcional.

E mais, Palocci foi mandante de um crime como etapa preliminar de outro crime: a campanha de difamação de Francenildo. Algo assim como bandidos que roubam um carro para, em seguida, utilizarem-no num assalto.

O relator deste caso é -- logo quem! -- Gilmar Mendes, cuja condição de presidente do STF lhe permitiria delegar a função para outro ministro. Mas, fez questão de incumbir-se pessoalmente do relatório.

Se precedentes significam algo, vem aí uma decisão tão aberrante quanto a tomada no julgamento do diploma de jornalista, que teve Mendes como relator. Os rumores em Brasília são de que, utilizando filigranas jurídicas, o STF absolverá Palocci.

Quem conhece algo sobre os tribunais, sabe que doutos juristas elaboram doutos pareceres para se justificar seja lá o que for. Até que a Terra é quadrada, se isto convier aos poderosos.

E que, nos casos de maior importância, a decisão acaba sendo sempre política, embora ornamentada com blablablá jurídico.

Muitos acusam Mendes de ter chegado aonde chegou graças a um forte empenho tucano em seu favor. Então, por que remover este obstáculo do caminho de Palocci, tido como possível candidato petista à Presidência da República se a candidatura de Dilma Rousseff não emplacar?

Minha impressão é de que, neste caso, um valor mais alto se alevanta: a pressão dos banqueiros.

Politicamente, Palocci era ninguém até 2002, tão desimportante no petismo quanto o fora no longínquo envolvimento com o trotskismo (se leu A Moral Deles e a Nossa, há muito deve tê-lo esquecido...).

Tudo mudou de figura quando ele foi escolhido por Lula para zelar pelos interesses do grande capital em seu Ministério

Como todos sabem, o preço do sinal verde dado pelo poder econômico para que Lula enfim chegasse à Presidência foi implementar obedientemente uma política econômica neoliberal. Um pacto que deve ter sido firmado com sangue, como o diabo costuma exigir dos que lhe vendem a alma.

Tão bem se desincumbiu Palocci da missão que virou xodó dos banqueiros. Que achado, o PT ter encontrado um militante ao mesmo tempo esquerdista no passado (para não despertar suspeitas) e tãorealista no presente!

Tanto que, mesmo sendo um dos mais emporcalhados no mar de lama do mensalão, Palocci continuou com prestígio intacto na imprensa burguesa, quase sempre citado reverentemente. Daí a facilidade com que conquistou uma cadeira na Câmara Federal.

E banqueiros, mais do que ninguém, detestam correr riscos. Então, embora demonstrem claramente preferir uma vitória do demo/tucano José Serra em 2010, devem ter vislumbrado uma possibilidade de ganhar ou ganhar, como mais lhes apraz.

Se Palocci for isentado de sua flagrante culpa pelo STF, bastará os banqueiros investirem mais um pouco para detonar Dilma e pronto: a eleição ficará polarizada entre um ex-presidente da UNE brigando com seu passado e um petista tão domesticado quanto os micos de circo.

Mas, perguntarão os leitores mais perspicazes, por que me dou ao trabalho de revelar as motivações ocultas neste caso?

Não estou fazendo lobby para o STF condenar Palocci, pois só me interessam as decisões dos podres poderes em circunstâncias extremas, como a de evitar a ignomínia que seria a extradição de Cesare Battisti.

Empenho-me, isto sim, em fazer com que a militância idealista do PT (supondo que ainda exista...) perceba o quanto de traição aos princípios do partido haveria numa escolha de Palocci como candidato presidencial. Em termos de moral revolucionária, equivaleria ao conluio Lula-Collor-Calheiros para salvar Sarney.

Por que é sempre a moral revolucionária que inspira meus posicionamentos, não a moral burguesa. As diferenças são significativas.

A moral burguesa, p. ex., valoriza ao extremo o fato de alguém ganhar seu sustento com trabalho honesto.

A moral revolucionária só considera dignificante o trabalho que serve ao bem comum e dá oportunidade ao ser humano para concretizar seu potencial criativo.

Um bancário ganha honestamente o sustento, mas sua faina, em última análise, só serve para enriquecer agiotas.

E o trabalhador de uma linha de montagem em nada se identifica com o produto final de seus esforços. Só apelando para malabarismos de imaginação ele reconhecerá como obra sua o automóvel do qual apertou um ou outro parafuso.

Uma das acusações mais graves que Marx lançou à burguesia foi a de ter aviltado o trabalho humano a tal ponto que, ao invés de propiciar a realização dos indivíduos, tornou-se o instrumento de sua escravidão.

Noves fora, as principais trangressões à moral revolucionária cometidas pelos mensaleiros foram três:
  • o desvio de dinheiro dos contribuintes, trabalhadores em sua maioria;
  • o recebimento de subornos do grande capital para facilitarem falcatruas;
  • a apropriação individual de parte dessa dinheirama ilícita (utilizarem meios escusos para o financiamento de projetos políticos já seria inadmissível, mas deles beneficiarem-se pessoalmente os igualou aos mais sórdidos políticos burgueses!).
O que Palocci fez foi além de uma transgressão moral: ele atentou contra a própria razão-de-ser dos revolucionários, que é a de ajudar os fracos a lutarem contra os poderosos.

Mobilizando o poder do Estado para achatar e violentar um caseiro, ele repetiu exatamente a postura daqueles a quem combatemos.

Então, de todos os réus do mensalão, é quem mais fundo atingiu os valores revolucionários. Pois agiu exatamente como qualquer coronelão fazia nos velhos tempos, usando e abusando dos podres poderes para colocar a bugrada no seu lugar.

Noutro dia, avaliei a bóia lançada pelo PT a Sarney como a segunda morte do partido (o mensalão foi a primeira).

Ter como candidato presidencial um Palocci seria, indiscutivelmente, a terceira. Aí, o alinhamento com os humilhados e ofendidos iria também para o ralo, como já o foi a moral revolucionária.

E, se a militância consentir com mais esta transição negativa, nada, absolutamente nada mais restará dos ideais que nortearam a fundação do partido em 1979.

2 comentários:

Anônimo disse...

Trostky também não leu o texto que ele próprio escreveu, vide a traição o acordo com o exército Makhnovista. Para não falar do massacre em Kronstadt...

celsolungaretti disse...

Trotsky errou em circunstâncias dramáticas, quando a república soviética estava seriamente ameaçada.

Não estava defendendo seus interesses mesquinhos; agiu como julgava ser necessário para que a revolução sobrevivesse.

Já o Palocci pisou feio na bola (e nos princípios!) quando só a cabeça dele estava a prêmio.

E, cá entre nós, não dá para compararmos um titã com um anão.

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