terça-feira, 30 de dezembro de 2008

ISRAEL COMETE "GENOCÍDIO" E "CRIME CONTRA A HUMANIDADE"

Não espero para ver como os outros se posicionam quando há acontecimentos do tipo das agressões brutais de Israel à população civil palestina. Emito minha opinião, pelo que ela possa valer, de bate-pronto.

O que conta, para mim, são sempre os princípios.

Como combatente da resistência à ditadura, aos 18 anos de idade eu já acreditava que guerras se travam entre os nelas engajados, não devendo estender-se aos civis. É uma covardia e uma infâmia atingir (ou criar situações que levem a ser atingidos) crianças, mulheres, velhos e outros cidadãos alheios ao conflito.

Então, sem ser nenhum anti-sionista furibundo (até porque reconheço a extraordinária contribuição de grandes judeus aos movimentos libertários dos séculos passados e ao humanismo através dos tempos), não tive nenhuma dúvida de que ocorria uma carnificina na faixa de Gaza e de que eu deveria repudiá-la da forma mais veemente.

Hoje, com satisfação, constato que minha avaliação estava correta. Editorial, noticiário e espaços opinativos da edição de 30/12 da Folha de S. Paulo vêm ao encontro do que afirmei desde o primeiro momento.

E, como o verdadeiro jornalismo anda em baixa, vale a pena reproduzir os trechos mais marcantes desses textos exemplares:

"Merecem repúdio os ataques do grupo extremista palestino Hamas contra o território israelense. Mas a brutal reação de Israel, que abusou do legítimo direito de defesa e provocou uma crise humanitária na faixa de Gaza, tampouco pode deixar de ser condenada.

"...Não se esperava (...) um contra-ataque tão maciço das forças israelenses, surpresa que está assentada em motivações não apenas militares, mas também políticas.

"...A ofensiva contra o Hamas, em Gaza, soa como uma cartada da coalizão governista para evitar a vitória de Binyamin Netanyahu na eleição do novo gabinete, em fevereiro. O ex-premiê de direita radical, crítico do que chama de tolerância excessiva com grupos palestinos hostis a Israel, lidera as pesquisas de opinião.

"A inclinação do eleitorado israelense para a direita também parece uma reação à política anunciada para o Oriente Médio por Barack Obama. O presidente eleito dos EUA promete uma diplomacia abrangente e não descarta negociar com o Irã, considerado em Israel a maior ameaça estratégica ao Estado judaico.

"A plataforma linha-dura que emerge dessa confluência de fatores contém armadilhas conhecidas. Por mais que o Exército de Israel imponha danos importantes aos extremistas, os bombardeios dificilmente vão tirar do Hamas o controle político de Gaza...

"Se optar pela invasão terrestre, o governo israelense vai incorrer no mesmo risco da operação realizada no Líbano. O Exército de Israel poderá até ocupar os prédios do governo e capturar lideranças do Hamas, mas isso não vai aniquilar o extremismo naquela estreita faixa litorânea.

"De vício parecido padece o bloqueio econômico e à circulação imposto pelos israelenses contra 1,5 milhão de palestinos que vivem na empobrecida região de Gaza. Trata-se de uma medida desumana, que só faz aumentar o ressentimento contra Israel.

"Sem uma solução política que dê autonomia de fato e viabilidade econômica para um Estado palestino no Oriente Médio, o substrato que favorece as espirais de hostilidades permanecerá intacto. O importante agora, contudo, é obter um cessar-fogo imediato entre Hamas e Israel." (editorial "Cessar-fogo imediato")

"No terceiro dia consecutivo de bombardeios israelenses, além de terem de contornar a escassez de medicamentos, energia elétrica, gás de cozinha, combustíveis e alimentos, os habitantes da faixa de Gaza evidenciavam temor de ir aos templos muçulmanos da região.

"'Os hospitais e as mesquitas eram os lugares mais seguros. Mas, hoje [ontem], notei que as pessoas estão preocupadas e com medo de ir às mesquitas para fazer suas orações, porque os israelenses as atingiram na ofensiva", disse Hazem Balousha, que reporta para o jornal britânico 'Guardian', de Gaza.

"Ele relatou ao menos cinco templos bombardeados na região. Uma das mesquitas atingidas é próxima do hospital Shifa, o principal de Gaza." (notícia "Ofensiva não poupa nem mesquitas de Gaza")

"Não se trata de desprezar os riscos que Israel corre, seja pelo terrorismo praticado pelos fundamentalistas, seja pelos ataques com foguetes disparados desde Gaza. Mas adotar punição coletiva é intolerável, além de ineficaz. Acaba apenas jogando mais jovens no desespero que é, em parte, a estufa em que se incubam terroristas.

"Não adianta também tentar asfixiar o Hamas, que governa Gaza e é uma das raríssimas administrações no mundo árabe nascida de eleições que a comunidade internacional aceitou como justa e livre. A menos que se acredite que o Hamas ganhou porque todos os palestinos de Gaza são terroristas. Quem acredita nessa hipótese vai acabar propondo a 'solução final' para o gueto de Gaza." (Clovis Rossi, colunista)

"O que ocorre na Faixa de Gaza é extermínio de civis. Deliberado, como demonstram os bombardeios a acampamentos de refugiados, colunas de fugitivos e tantos outros alvos. Esse extermínio tem nome técnico e jurídico: é genocídio. Pelas leis internacionais, é crime de guerra e crime contra a humanidade." (Jânio de Freitas, colunista)

segunda-feira, 29 de dezembro de 2008

LEI FOI APLICADA RETROATIVAMENTE PARA CONDENAR CESARE BATTISTI

Uma legislação de exceção promulgada na Itália em 1981, a chamada Lei Cossiga, serviu para condenar o escritor e preso político Cesare Battisti por crimes ocorridos em 1978 e 1979, dos quais se declara inocente. "A Lei Cossiga retroage no tempo para me condenar à revelia, contrariando todas as doutrinas do direito democrático", afirma Battisti.

Em carta escrita no próprio dia de Natal, Battisti, prisioneiro no Brasil como consequência de pedido de extradição apresentado pela Itália, conclamou os brasileiros solidários à sua causa a insistirem junto ao Judiciário e Legislativo, no sentido de que lhe seja assegurado amplo direito de defesa, possibilitando que sua versão dos fatos "seja conhecida por todos", como contraponto às distorções do governo direitista italiano.

Battisti acusa a embaixada italiana de ter feito uma armação contra ele, daí a importância de, com provas documentais, mostrar-se "ao ministro da Justiça, ao STF e à mídia em geral que as que as informações prestadas e apresentadas a Justiça brasileira, pela embaixada e governo italiano, são carentes de fundamentos legais e distorcem a realidade dos fatos".

Como a tradição brasileira é de conceder refúgio humanitário aos perseguidos políticos, a embaixada italiana chegou ao absurdo de alegar que os atos imputados a Battisti seriam crimes comuns, motivados por vingança pessoal, numa grotesta tentativa de embaralhar os fatos.

Foram, isto sim, ações cometidas e assumidas pelo grupo político Proletários Armados para o Comunismo, ao qual Battisti pertencia. Tanto que ele foi enquadrado numa lei criada para regulamentar a luta contra o terrorismo, recebendo pena de prisão perpétua; para crimes comuns, a pena máxima na Itália é de 30 anos.

Battisti também ressaltou ter sido condenado por uma lei visivelmente inspirada no código de Mussolini, que o acusou de insurreição contra o poder do Estado. "Esta doutrina totalitária e fascista aparece dezenas de vezes ao longo das mil páginas do documento de acusação."

Finalmente, o escritor destacou o quanto há de paradoxal na sua situação: "Cabe ao judiciário brasileiro julgar se devo ser extraditado e punido por fatos originários de minha militância político-ideológica de 30 anos atrás. O que não deixa de ser irônico, já que, no Brasil, todos que se envolveram em atividades desta natureza foram beneficiados pela anistia, enquanto eu continuo sendo perseguido e correndo o risco de ser punido de forma arbitrária".

domingo, 28 de dezembro de 2008

CARNIFICINA FOI O PRESENTE DE ISRAEL AOS PALESTINOS

Cerca de mil palestinos, incluindo mulheres e crianças, foram atingidos pelas bombas que Israel disparou na faixa de Gaza.

Não houve, sequer, a preocupação de escolher horários em que houvesse menos pessoas nas ruas.

Foi uma agressão bestial, repulsiva, inominável.

Todo indivíduo, grupo ou nação que, sofrendo ataques de inimigos identificados, retalia indiscriminadamente em civis inocentes, é um réprobo aos olhos da civilização.

Os judeus parecem um triste exemplo de vítimas que, ao tornarem-se poderosas, acabaram reproduzindo as piores práticas dos seus carrascos.

Tudo que havia de belo e nobre no sonho da nação judaica virou uma caricatura grotesca:
* os kibutzim cada vez mais deixam de ser comunidades coletivas voluntárias, de inspiração socialista, para assemelharem-se às empresas capitalistas, inclusive contratando trabalhadores em regime assalariado;
* a perspectiva de viver em harmonia com os vizinhos cedeu lugar à mentalidade de bunker, com todas as distorções decorrentes (a absoluta falta de compaixão pelos não-judeus, encarados como não-pessoas, em primeiro lugar);
* e a milenar tradição humanista do povo judeu hoje está em frangalhos, depois de décadas de carnificinas cometidas contra os povos árabes, sobejamente incapazes de resistir à superioridade militar israelense.

Israel é mais uma utopia que virou distopia, um 1917 que se tornou 1984 orwelliano. Lamento profundamente.

Mas, nunca deixarei de registrar minha indignação e meu protesto contra matanças como esta que os israelenses, emblematicamente, cometeram dois dias após o Natal.

sábado, 27 de dezembro de 2008

ERROS COMPROMETEM INVESTIGAÇÃO DO CASO ISABELLE

George Sanguinetti, respeitadíssimo médico legista (foi quem estabeleceu que P.C. Farias e amante foram vítimas de duplo homicídio, não tendo matado um ao outro, como se tentou fazer crer) contratado pelos advogados Alexandre Nardoni e Anna Carolina Jatobá, concedeu longa entrevista à revista Época, reforçando a impressão de que a espetacularização do caso Isabelle levou a uma investigação eivada de erros, em que a pressão da opinião pública, açulada pela mídia, sobrepôs-se à consistência técnica.

Não possuo conhecimento específico para concluir se ambos são ou não culpados. Mas, mantenho o que disse na época: o direito de defesa foi atropelado por um rolo compressor midiático. Concordo inteiramente com a posição do legista, de que a investigação terá de ser retomada (eufemismo para refeita), num clima mais sereno, sem holofotes e maltas ululantes.

Eis um trecho interessante da entrevista de Sanguinetti:

"...tecnicamente, há muitas falhas no arrazoado de imputação de culpa a eles. Não há nem nunca houve marca de esganadura em redor do pescoço e eu, um professor de medicina legal com 35 anos de profissão, tive que ouvir de um perito de São Paulo que pode haver esganadura sem lesões externas e internas. Está nos autos e foi dito frente ao excelentíssimo juiz. Isso é um absurdo, não pode acontecer. Tenho gravada uma entrevista de TV que mostra um perito dizendo que não houve esganadura. O atrapalho que houve foi interpretativo. Queriam mostrar, além do fato de a menina ser jogada, uma cena de selvageria da pior qualidade, que não tem consistência. É o caso da agressão dentro do carro, em que está descrito que o ferimento teria sido produzido “possivelmente” com uma chave. Que chave? Cadê a prova técnica? Para citar a existência, tem que mostrar o instrumento. Cadê o instrumento que fez aquela lesão? Se não apresentou nenhum, apresente como mais uma conseqüência da queda, do politraumatismo. Também não aceito o fato de que não houve fraturas da queda porque havia chovido, a terra não estava compactada e havia um gramado de dez centímetros. Tenha paciência! Isso é cartesiano e atinge o meu raciocínio. Colocaram que houve duas mortes, a primeira, de esganadura por asfixia mecânica. Nunca. E, depois, o politraumatismo. São erros. Além disso, colocam no laudo que foi uma “morte violenta”. Isso é redundância. Toda morte que vai para o IML não é natural, é violenta. Para colocar uma pena maior, também colocam “houve uso de violência devido à esganadura”. A violência foi feita em se jogar a criança do sexto andar."

quinta-feira, 25 de dezembro de 2008

CANALHA

O presidente da Vale, Roger Agnelli, defendeu recentemente a volta à ditadura, pelo menos na economia. Trata-se do remédio que ele propõe para a crise cíclica capitalista em curso: "Olha, estamos vivendo uma situação de exceção. Para lidar com ela, precisamos tomar medidas de exceção"

Deu o exemplo, demitindo 1,3 mil funcionários, colocando 5,5 mil em férias coletivas e desativando algumas minas.

Evidentemente, poderia ter deixado essas medidas para janeiro, evitando estragar o Natal de 6,8 mil seres humanos. Mas, preferiu iniciar o quanto antes as pressões para arrancar regalias e favorecimentos do Governo. Os funcionários que se danem!

Interlocutor assíduo do presidente Lula, ele tem sugerido iniciativas "no sentido de flexibilizar um pouco as leis trabalhistas".

Ciente do fedor pestilento que sua posição exala, Agnelli tenta dourar a pílula: "Seria algo temporário, para ajudar a ganhar tempo enquanto essa fase difícil não passa".

O que ele propõe, afinal? "Suspensão de contrato de trabalho, redução da jornada com redução de salário, coisas assim, em caráter temporário."

Na noite de Natal, vi um exemplo de onde os Agnellis da vida nos querem conduzir.

Hóspede do meu sogro num prédio de apartamentos de Praia Grande (SP), ficamos sabendo que todos os serviçais, terceirizados, não haviam recebido o salário de novembro, nem a 2ª parcela do 13º salário, apesar do condomínio estar com as contas em dia.

Para o pobre porteiro que nos ajudava a armar o cenário para a ceia comum dos condôminos, não haveria Natal. Papai Noel não passaria em sua casa. O almoço seria o de sempre, depois do exaustivo plantão da véspera.

E os Agnellis ainda querem que os pobres trabalhadores sejam mais sacrificados ainda, pagando a conta da recessão de que não foram eles os causadores.

Não sei por que, não me sai da cabeça uma composição do criativo Walter Franco: "Canalha".

terça-feira, 23 de dezembro de 2008

UM NATAL ENTRE O ABISMO E A ESPERANÇA

O que o mundo realmente celebra no Natal? A saga de um carpinteiro que trouxe esperança a pescadores e outras pessoas simples de um país subjugado ao maior império da época.

Os primeiros cristãos eram triplamente injustiçados: economicamente, porque pobres; socialmente, porque insignificantes; e politicamente, porque tiranizados.

Jesus Cristo nasceu três décadas depois da maior revolta de escravos enfrentada pelo Império Romano em toda a sua existência.

As mais de seis mil cruzes fincadas ao longo da Via Ápia foram o desfecho da epopéia de Spartacus, que, à sua maneira rústica, acenou com a única possibilidade então existente de revitalização do império: o fim da escravidão. Roma ganharia novo impulso caso passasse a alicerçar-se sobre o trabalho de homens livres, não sobre a captura e o chicote.

Vencido Spartacus, não havia mais quem encarnasse (ou pudesse encarnar) a promessa de igualdade na Terra.

Jesus Cristo a transferiu, portanto, para o plano místico: todos os seres humanos seriam iguais aos olhos de Deus, devendo receber a compensação por seus infortúnios num reino para além deste mundo.

Este foi o cristianismo das catacumbas: a resistência dos espíritos a uma realidade dilacerante, avivando o ideal da fraternidade entre os homens.

Hoje há enormes diferenças e uma grande semelhança com os tempos bíblicos: o império igualmente conseguiu neutralizar as forças que poderiam conduzir a humanidade a um estágio superior de civilização.

A revolução é mais necessária do que nunca, mas inexiste uma classe capaz de assumi-la e concretizá-la, como o fez a burguesia, ao estabelecer o capitalismo; e como se supunha que o proletariado industrial fizesse, edificando o socialismo.

O fantasma a nos assombrar é o do fim do Império Romano: que este impasse nos leve à decadência extrema e, enfim, nos sujeite à destruição cega.

O capitalismo hoje produz legiões de excluídos em muito semelhantes aos bárbaros que deram fim a Roma; não só os que vivem na periferia do progresso, mas também os miseráveis existentes nos próprios países abastados, vítimas do desemprego crônico.

E as agressões ao meio ambiente, decorrentes da ganância exacerbada, estão atraindo sobre nós a fúria dos elementos, com conseqüências avassaladoras. Décadas de catástrofes serão o preço de nossa incúria.

No entanto, como disse o grande jornalista Alberto Dines, “criaturas e nações cometem muitos desatinos, mas na beira do abismo recuam e escolhem viver”.

Se a combinação do progresso material com a influência mesmerizante da indústria cultural tornou o capitalismo avançado praticamente imune ao pensamento crítico e à gestação/concretização de projetos alternativos de organização da vida econômica, política e social, tudo muda durante as grandes crises, quando abrem-se brechas para evoluções históricas diferentes.

Temos pela frente não só uma recessão mundial (que ninguém, em sã consciência, pode garantir que não desemboque numa depressão tão terrível como a da década de 1930), como a sucessão de emergências e mazelas decorrentes das alterações climáticas.

O sofrimento e a devastação serão infinitamente maiores se os homens enfrentarem desunidos esses desafios. Caso as nações e os indivíduos prósperos venham a priorizar a si próprios, voltando as costas aos excluídos, estes morrerão como moscas.

O desprendimento, substituindo a ganância; a cooperação, em lugar da competição; e a solidariedade, ao invés do egoísmo, terão de dar a tônica do comportamento humano nas próximas décadas, se as criaturas e nações escolherem mesmo viver.

E há sempre a esperança de que os mutirões criados ao sabor dos acontecimentos acabem apontando um novo caminho para os cidadãos: o de que mobilizando-se e organizando-se para o bem comum aproveitam muito melhor suas próprias potencialidades e os recursos finitos do planeta.

Então, para além deste Natal transformado na própria celebração do templo e de seus vendilhões, vislumbra-se outro, o verdadeiro. Se frutificarem os esforços dos homens de boa vontade.

segunda-feira, 22 de dezembro de 2008

NÃO DESVIAREI DA ROTA

Minha Carta Aberta ao Governador José Serra ( http://naufrago-da-utopia.blogspot.com/2008/10/carta-aberta-ao-governador-jos-serra.html ), pedindo a extinção da unidade-símbolo da violência policial em São Paulo provocou uma reação coordenada dos defensores da lei do mais forte.

Estão endereçando dezenas de mensagens de críticas, insultos e ameaças ao meu e-mail e à minha página do Orkut, além de postá-los nos comentários de meus blogs.

Então, minha resposta é esta:

1) Não retiro uma única palavra que escrevi a respeito da Rota;

2) Sempre que houver possibilidade de trazer o assunto novamente à baila, voltarei a pedir sua extinção;

3) Assumo o risco de sofrer retaliações e deixo aqui um registro, para a eventualidade de algo me acontecer;

4) Depois de ter ousado enfrentar o Exército, não serão aqueles que então atuaram como seus serviçais insignificantes que vão me intimidar;

5) Finalmente, aconselho a Rota a apagar do seu site as loas a operações por ela desenvolvidas durante a ditadura, as quais, em todo o mundo civilizado, hoje têm uma imagem tão negativa quanto as chacinas da Gestapo.

PROFISSÃO: REPÓRTER?

No início da década passada, trabalhando na Agência Estado, eu era escalado semana sim, semana não, para o plantão dominical.

Naquele tempo em que inexistia TV por assinatura e não se permitia que a televisão transmitisse o jogo para a mesma praça em que era disputado, a única forma de acompanharmos a partida de futebol da própria capital paulista era a transmissão radiofônica.

Os clientes da agência pressionavam: queriam receber o quanto antes a notícia sobre o clássico de domingo, para fecharem suas edições de 2ª feira.

Então, não dava para esperarmos que os repórteres de O Estado de S. Paulo e do Jornal da Tarde voltassem do estádio e redigissem suas matérias.

O jeito era colarmos o ouvido no rádio e criarmos um texto a partir do que conseguíamos depreender do blablablá de locutores e comentaristas.

É claro que, vez por outra, caíamos feio do cavalo, escrevendo algo bem distante do que realmente havia acontecido.

E ficávamos amaldiçoando as gambiarras que éramos obrigados a executar, ao invés de exercermos nossa função de jornalistas como manda o figurino.

Isto me veio à lembrança ao ler a matéria da Folha de S. Paulo de domingo sobre a luta de boxe cujo resultado foi anunciado no início da madrugada.

Evidentemente, deve ter sido o último texto a entrar naquela edição. E o redator, claro, o escreveu assistindo à luta pela TV.

Devido ao apuro de tempo, ele deve ter preparado previamente alguns parágrafos que poderiam ser utilizados, como este:

"Com o resultado de ontem, 'Big' George Foreman, deixou de ser o mais velho campeão dos pesos-pesados de todos os tempos. Aos 45 anos, nocauteara o compatriota americano Michael Moorer para se tornar campeão da FIB e da AMB".

Só serviria, claro, no caso de Evander Holyfield ser o vencedor, arrancando tal primazia de Foreman. Não foi o que ocorreu.

Mas, na correria de fechamento, o coitado do repórter acabou colando-o por engano, o que tornou sua matéria um verdadeiro samba do crioulo doido.

É o padrão Folha de qualidade, versão 2008...

domingo, 21 de dezembro de 2008

FILME ERRADO

Evander Holyfield, pugilista de boa técnica mas que teve sua carreira prejudicada pela falta de potência nos golpes, acreditou que viveria na madrugada de domingo seu Rocky IV, derrotando um gigante russo.

Só que o filme era outro: Rocky Balboa, sobre o veterano que volta da aposentadoria e consegue não ser nocauteado pelo campeão, perdendo só por pontos.

O resultado mais justo teria sido um empate, o que daria exatamente no mesmo, com Nikolai Value conservando o título de pesos-pesados.

Para quem ligou a tevê pensando que assistiria a outra batalha épica de Davi contra Golias, a luta foi uma decepção só.

Davi passou a luta inteira fugindo e dando sopapos que nem de longe abalavam o adversário.

E Golias parecia estar com preguiça de cercar e liquidar o fracote, contentando-se em tonteá-lo duas vezes.

Então, estamos conversados: a grande luta Davi x Golias continua sendo aquela em que o extraordinário Muhammad Ali mandou à lona o terrível George Foreman.

E o homem mais idoso a conquistar o título peso-pesado ainda é o mesmo George Foreman, que, aos 45 anos, surpreendeu um bisonho campeão de entressafra (Michael Moorer) com seu demolidor cruzado de direita.

Quanto a Holyfield, será lembrado mesmo é por haver tido parte de sua orelha arrancada por Mick Tyson, num dos repentes mais grotescos da história da boxe.

"EXÍMIO ATIRADOR"?

Excelente resposta do ministro Franklin Martins (Comunicação Social) a jornalista que lhe indagou sobre a qualificação de "exímio atirador" nas fichas policiais da ditadura militar:

"Estava lutando contra um regime que, de arma na mão, derrubou o presidente constitucional, fechou os sindicatos, instituiu a censura, acabou com os partidos políticos, prendeu gente até dizer chega, tirou um grande número de parlamentares do Congresso, prendeu, torturou, matou... não sei por que eu teria uma relação de 'eu só luto até certo ponto contra a ditadura'. Não. Felizmente, nunca tive de atirar em ninguém."

sábado, 20 de dezembro de 2008

CONTESTAÇÃO ARMADA: ALEMANHA ENTERRA DE VEZ O PASSADO

Libertada na Alemanha a último pessoa presa por haver integrado a Fração do Exército Vermelho na década de 1970: Christian Klar. A Justiça alemã considera que Klar já não possa trazer perigo à sociedade.

Hoje com 56 anos, ela foi condenada à prisão perpétua por nove assassinatos.

Ou seja, mesmo no caso de uma ex-militante sobre a qual não paira dúvida de que foi culpada de homicídios, o Judiciário alemão leva em conta que seus delitos pertencem a uma página definitivamente virada da história européia.

Já no caso de Cesare Battisti -- cujo julgamento foi uma aberração jurídica tal que o declararam culpado de dois assassinatos cometidos simultaneamente em cidades tão distantes que seria impossível ele estar presente nas duas ações -- a intransigência beira o absurdo.

Para qualquer observador isento, fica evidente haver motivação política na sanha vingativa de Berlusconi.

Será a suprema ignomínia se o Brasil se prestar ao papel de capitão-do-mato para o novo Duce...

quinta-feira, 18 de dezembro de 2008

O ABISMO E A ESPERANÇA

"...nunca tivemos uma posse na Casa Branca cercada por tanta esperança, mesmo sabendo que não haverá mágicas. Consolo é saber que a humanidade não é suicida, ela se move sempre na direção ditada pelo seu instinto de sobrevivência.

"Foi assim há 70 anos, quando começou a Segunda Guerra Mundial, considerada a maior catástrofe dos últimos 500 anos, e assim será agora. Criaturas e nações cometem muitos desatinos, mas na beira do abismo recuam e escolhem viver."

O arauto da esperança é uma lenda viva do jornalismo brasileiro: Alberto Dines.

Foi com textos como este que Dines nos ajudou a manter o moral elevado, quando as trevas da ditadura pareciam não ter mais fim.

E agora, diante da ameaça imediata de uma recessão que ninguém sabe como e quando terminará, bem como da certeza de que as próximas décadas serão marcadas pela vingança da natureza contra nossa incúria e nossa ganância, Dines encontra novamente as palavras certas para fortalecer-nos o ânimo.

Faltou acrescentar que, na beira do abismo, criaturas e nações terão de perceber o óbvio: só priorizando o bem comum e cooperando irmanamente entre si conseguirão sobreviver.

Eu também acredito que recuarão, recusando-se a morrer juntamente com o capitalismo.

segunda-feira, 15 de dezembro de 2008

PROFISSÃO: REPÓRTER

É o título de um filme extraordinário de Michelangelo Antonioni, com Jack Nicholson no papel de um jornalista que, cansado da vida e da carreira, resolve trocar seu destino com o de um sujeito parecido com ele, morto no quarto ao lado do hotel.

Deixa seus documentos com o defunto e passa a usar os dele, inclusive comparecendo a encontros anotados da agenda do falecido... sem saber que se tratava de um traficante de armas.

Hoje há uma bobagem na grade da Globo em que tiveram a infeliz idéia de utilizar o mesmo nome. Será que pretendiam homenagear o grande cineasta italiano? Ele deve estar é se revirando na cova...

Mas, o meu tema é mesmo o ofício de jornalista, ultimamente exercido por muita gente que não tem a menor afinidade com ele.

Lembro-me de um episódio emblemático.

Certa vez, um colega da Folha de S. Paulo noticiou que, segundo um pesquisador da Faculdade de Economia e Administração da USP, a economia informal estava gerando xis por cento do PIB brasileiro.

Curto demais para a complexidade do assunto e, portanto, confuso, o texto dele não teve a menor repercussão.

Esperei umas duas semanas, procurei o mesmo acadêmico e conversei duas horas com ele, até entender direitinho o trabalho que realizara e todas as suas implicações.

O principal erro do meu colega foi dar a impressão de que a economia informal gerava, digamos, 25% do PIB oficial. A conclusão do pesquisador era de que, se computada, a economia informal acrescentaria 25% ao PIB oficial.

Em vez de uma notícia de 20 linhas, como a da Folha, avaliei que o assunto valia umas 130. Tornei tudo bem didático e compreensível para os leigos.

Comercializado pela Agência Estado, meu texto foi publicado no Brasil inteiro. A Globo interessou-se pelo assunto, utilizando o despacho da AE como pauta para entrevistar o acadêmico -- que foi também chamado a Brasília, para apresentar pessoalmente seu estudo ao ministro da Fazenda.

Este caso me veio à lembrança quando percebi o erro cometido pela IstoÉ desta semana, ao noticiar a vinda da escritora Fred Vargas ao Brasil, trazendo provas de uma trama de advogado contra Cesare Battisti.

Num primeiro momento, acreditei no relato do colega e até escrevi meu próprio texto em cima da informação dada pela revista.

Logo em seguida, visitando o site Cesare Livre, tive minha atenção atraída por uma matéria antiga infinitamente mais bem apurada e redigida. E percebi que o reporter da IstoÉ trocara as bolas num detalhe crucial.

Felizmente, ainda estava em tempo de eu soltar uma matéria retificadora. Mas, por conta disso, avancei na madrugada reescrevendo o texto.

E só pude veiculá-lo quando o UOL fez a gentileza de me restituir o uso da Internet, após outra de suas habituais panes...

domingo, 14 de dezembro de 2008

ESCRITORA TRAZ PROVAS DE TRAMA CONTRA CESARE BATTISTI

Uma farsa desmascarada é o trunfo com que a escritora parisiense Fred Vargas conta para convencer o ministro da Justiça Tarso Genro a conceder refúgio humanitário a Cesare Battisti, preso no Brasil desde março/2007 e fortemente ameaçado de extradição para a Itália, onde teria de cumprir uma pena de 30 anos de prisão (*). Vargas espera ser recebida por Genro nos próximos dias, para apresentar-lhe pessoalmente as provas que trouxe em sua bagagem.

Acusado de atos violentos praticados por seu grupo (Proletários Armados para o Comunismo) na década de 1970, Cesare foi condenado à prisão perpétua na Itália quando estava foragido no exterior. Teria, teoricamente, o direito de pleitear novo julgamento, em que pudesse exercer seu escamoteado direito de defesa.

No entanto, três cartas supostamente enviadas por Battisti a um advogado serviram para atestar que ele estaria ciente da realização dos julgamentos e até orientando a defesa.

Ocorre que ele, ao fugir da Itália, deixara nas mãos desse advogado três folhas em branco com sua assinatura. E a perita grafológica do Tribunal de Recursos de Paris, Evelyne Marganne, atestou que a assinatura de Battisti é anterior em vários anos aos textos constantes nos documentos.

Ou seja, o advogado guardou as folhas e, quando foi conveniente, acrescentou-lhes dizeres extremamente lesivos aos interesses de Battisti.

O prejuízo foi total. O escritor acabou tendo sua extradição autorizada pelo Judiciário da França, país que o abrigava (fugiu de novo, dessa vez para o Brasil). E, na Itália, seu caso está definitivamente encerrado.

Fred Vargas explica que tal advogado representava outros réus no mesmo caso e assim agiu para favorecê-los processualmente, fazendo com que as acusações mais graves recaíssem sobre Battisti.

Um dado importante: o principal beneficiário da manobra é um militante que recorreu à delação premiada (acusou os antigos companheiros em troca da redução de sua pena). Então, faz todo sentido que utilizasse meios ilícitos, além dos imorais, para se livrar da prisão.

A escritora Fred também adverte que, se Battisti for extraditado para a Itália, os grupo de extrema-direita vão assassiná-lo na cadeia: "Ele não viverá".

Ânimo rancoroso - O certo é que o ânimo rancoroso da sociedade italiana, após o bárbaro assassinato de Aldo Moro, desequilibrou os pratos da Justiça.

No afã de desarticular os grupos armados de esquerda a qualquer preço, o Judiciário da Itália incorporou a prática ignóbil e extremamente questionável da delação premiada, que acaba sempre servindo como estímulo para oportunistas fugirem às próprias responsabilidades, atribuindo-as a outros.

Passada a tempestade, houve uma volta à sensatez e ao equilíbrio característicos de um povo herdeiro das tradições humanistas. Inclusive em razão das aberrações jurídicas que macularam seu processo, Cesare acabou sendo deixado em paz na França por longo tempo.

Até que, com a chegada da direita italiana ao poder, foi aberta a estação de caça ao símbolo. Cesare, culto e articulado, é o troféu que Silvio Berlusconi sonha ostentar na sua parede.

Esperamos que Tarso Genro tenha sabedoria para discernir de que lado está a verdade e grandeza para colocar o espírito de justiça acima de quaisquer outras considerações.

* Condenado à prisão perpétua pelo envolvimento em quatro homicídios para os quais jura não ter concorrido, Battisti só terá sua extradição concedida se a Itália aceitar reduzir a pena para, no máximo, 30 anos de detenção, conforme preceito brasileiro.

domingo, 7 de dezembro de 2008

COLUNISTA DENUNCIA "O BRASIL ESCONDIDO, QUE ALIMENTA A BARBÁRIE E SERVE À MORTE"

O colunista Jânio de Freitas denuncia na Folha de S. Paulo de hoje: o governo brasileiro ficou de fora do tratado contra fabricação, uso e venda de bombas de fragmentação, já assinado por 92 países.

Eis os trechos mais marcantes, que subscrevo, compartilhando em gênero, número e grau a indignação do velho jornalista:

"As bombas de fragmentação, como o nome indica, desmancham-se em numerosos artefatos que se espalham por vasta área, cada um deles capaz de explodir logo ou de aguardar no solo que, em dia incerto, alguém pise ou apanhe e assim o faça explodir. Não se trata então, por mais que os interessados o afirmem, de arma de defesa.

"Os estudos sobre os efeitos do emprego dessa bomba pelos Estados Unidos e por Israel, no Oriente conflagrado, atestam-na como armamento de ataque. Do contrário, as vítimas fatais e de mutilação não seriam populações civis, urbanas e rurais. Eis aí o tipo de armamento que o Brasil está produzindo, em pelo menos três indústrias bélicas, e vendendo sem limitações...

"Tudo isso, e muito mais e muito pior, passa-se às escuras, sem conhecimento da população, sem conhecimento do Senado e da Câmara, sem conhecimento do sentido presente na Constituição para a identidade do Brasil entre os países.

"O Brasil escondido, que alimenta a barbárie e serve à morte, justificaria, e no entanto não precisa temer, uma cruzada de Ministério Público, meios de comunicação, universidade, intelectuais e artistas, para trazê-lo à luz dos dias. E confrontá-lo, para confirmação ou recusa, com o tipo de país que se pretende ter.

"Na recusa ao banimento das bombas de fragmentação, que teriam feito o gozo dos exércitos nazistas, o Brasil alinhou-se a Estados Unidos, Israel, Rússia e aos outra vez atritados Índia e Paquistão."

sexta-feira, 5 de dezembro de 2008

GABEIRA: QUEM TE VIU, QUEM TE VÊ!

Acontecimentos dos últimos dias nos morros cariocas:

"O menino Matheus Rodrigues Carvalho, de 8 anos, morreu na porta de casa com um tiro na Favela Baixa do Sapateiro, no Complexo da Maré, por volta das 8h desta quinta-feira. Ele estava saindo para comprar pão quando foi atingido por um tiro de fuzil. De acordo com os moradores, o menino foi atingido por um policial que estava perseguindo um homem, supostamente do tráfico, com um rádio transmissor. Não houve troca de tiros. O tenente coronel Rogério Seixas do 22º BPM (Complexo da Maré) não quis falar sobre o assunto. Revoltados, moradores iniciaram um protesto. Alguns tentaram invadir o Destacamento de Policiamento Comunitário e atiraram ovos no Caveirão."

"Em uma atividade cultural organizado pelo Grupo Educação Popular, que seria realizada para os moradores do Morro da Providência, na praça Américo Brum foi interrompidas a tiros por policiais do GPAE (Grupamento de Policiamento em Áreas Especiais). A violenta ação da policia deixou uma jovem de 27 anos ferida por um tiro nas costas. Por volta das 17 horas, durantes os preparativos para o evento, um efetivo policial chegou no morro fortemente armado, cercando o local da atividade e as várias vielas próximas ao local, afastando os moradores que estavam no local. Com uma clara intenção a intimar os moradores a não participar do evento. Às 20 horas quando as luzes do local começavam a ser acessas para dar início ao evento, os policiais, sem nenhuma justificativa, iniciaram um tiroteio, causando um clima de terror e dispersando a população que estava no local para a atividade."

Coluna de hoje ("As novidades no front") de Fernando Gabeira na Folha de S. Paulo:

"A polícia conseguiu expulsar os traficantes do morro Dona Marta, na zona sul do Rio. (...) Uma das razões do sucesso inicial no Dona Marta foi o número de homens empregados: 70. Alguns postos policiais com apenas 25 homens, distribuídos em turnos, sofrem com a inferioridade tática diante dos traficantes. (...) Não é impossível impedir o domínio territorial armado nos morros do Rio. Nunca se tentou seriamente, com um plano articulado que pudesse ser avaliado em seus detalhes e tivesse um calendário verificável... tanto o tráfico como as milícias ocupam, militarmente, o território, privando milhares de pessoas de seus direitos elementares. O pior é que já sabemos como fazer, mas nunca reunimos todas condições necessárias."

COMENTÁRIO: O NOVO GABEIRA, EM VERSÃO PALATÁVEL PARA A GRANDE IMPRENSA E PARA OS CONSERVADORES & REACIONÁRIOS EM GERAL, PREOCUPA-SE SOMENTE COM A PRIVAÇÃO DOS DIREITOS ELEMENTARES DOS FAVELADOS POR PARTE DOS TRAFICANTES. NADA TEM A DIZER SOBRE A ATUAÇÃO DE UMA POLÍCIA QUE SE COMPORTA MAIS COMO TROPA DE OCUPAÇÃO NAZISTA, PRIVANDO OS FAVELADOS DE ATIVIDADES CULTURAIS E ATÉ DA PRÓPRIA VIDA. SE PERSISTIR TAL MENTALIDADE, O "PLANO ARTICULADO" QUE ELE PROPÕE, PRESUMIVELMENTE COM SUPERIORIDADE TÁTICA DOS POLICIAIS DIANTE DOS TRAFICANTES, ACABARÁ SENDO UM PLANO DE EXTERMÍNIO.

quinta-feira, 4 de dezembro de 2008

PMDB: QUEM TE VIU, QUEM TE VÊ!

"Hoje a gente nem se fala mas a festa continua
Suas noites são de gala, nosso samba ainda é na rua
Hoje o samba saiu lá lalaiá, procurando você
Quem te viu, quem te vê
Quem não a conhece não pode mais ver pra crer
Quem jamais esquece não pode reconhecer"
(Chico Buarque, "Quem te viu, quem te vê")

O PMDB é a mala sem alça que os governos estão sendo obrigados a carregar, para conseguirem aprovar seus projetos no Congresso. Recebe cargos, dá apoio. Quem não aceita tal barganha acaba derrubado, como Collor.

Esquecido do seu desempenho marcante na luta pela redemocratização do País, esse partido se tornou um antro de negocistas e/ou reacionários.

Assim, não faz nem dois meses, o ministro de Minas e Energia Edison Lobão deitou falação defendendo a ditadura militar como "um momento em que o Brasil reencontrou seu futuro, sua vocação para o desenvolvimento".

Chegou ao cúmulo de afirmar que o regime militar não era uma verdadeira ditadura, como a de Getúlio Vargas, mas sim "um regime de exceção, autoritário, com Constituição democrática, que fazia eleições regularmente".

Ontem, outro ministro peemedebista de Lula mostrou a que veio.

Aliado a parlamentares ruralistas, o titular da Agricultura Reinhold Stephanes apresentou proposta para alterar o Código Florestal, liberando o plantio de dendê e outras espécies exóticas em áreas destinadas à recuperação de floresta nativa na Amazônia.

E mais: quer anistiar os produtores de todo o País que plantaram em áreas de preservação permanente até julho de 2007!

Como justificativa, a chantagem de sempre: os ruralistas dizem que, se o Código Florestal atual for respeitado, o agronegócio acabará.

Um especialista do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia, André Lima, manifestou sua perplexidade pelo fato de um ministro da Agricultura estar fazendo proposta que anula a base legal para o combate ao desmatamento exatamente um dia depois de o governo apresentar o Plano Nacional de Mudanças Climáticas e admitir metas internas de redução da devastação.

Não deveria surpreender-se, afinal Stephanes só usa tal título porque a sinceridade passa distante dos círculos do poder. Se a terminologia coincidisse com a atuação concreta, ele seria o Ministro do Fomento do Agronegócio.

quarta-feira, 3 de dezembro de 2008

CARTA DE CESARE BATTISTI...

...AO CONARE, QUE, CEGO E SURDO, IGNOROU-A E TOMOU UMA DECISÃO INCOMPATÍVEL COM A TRADIÇÃO BRASILEIRA DE DAR ABRIGO AOS PERSEGUIDOS POLÍTICOS DE OUTRAS NAÇÕES:

"São muitos os anos de perseguição política que sofro. Confesso que estou cansado. Após minha fuga da Itália, a minha militância deu-se como escritor, usando o espaço que me deram as editoras francesas e italianas para criticas a época política italiana dos anos de chumbo.

"Fui membro do PAC, mas nunca pratiquei atos de violência. Me abriguei em solo francês, pois a doutrina Mitterand protegia os militantes que renunciassem à prática de atos de violência. A verdade é que eu já havia publicamente renunciado à luta armada quando da morte de Aldo Moro. Tão logo percebi o caminho pelo qual a esquerda radical italiana poderia estar indo, fui radicalmente contra e cheguei mesmo a dizer a meus companheiros minha discordância.

"Fugi para a França, e da França para o México, e do México para a França, e da França para o Brasil. A pé, de ônibus, de avião, de carro, enfim, da forma que fosse possível. Fugi cruzando territórios e fronteiras, que nem sempre eram a minha destinação original. Fugi muitas vezes pensando que nunca mais veria minhas duas filhas, meus amigos, minhas referências de vida.

"Hoje estou cansado. Se volto para a Itália sei que vou morrer. Embora nunca tenha matado ninguém, me acusaram de ter matado policiais com base em um depoimento de um "arrependido" por delação premiada, que jogou a culpa por muitos atos praticados por ele próprio em mim. Sei que será difícil convencer as pessoas da verdade, pois mentiras contra mim foram repetidas mais de mil vezes.

"Nunca pratiquei atos de violência contra quem quer que seja, e não há testemunha presencial que me acuse de tal prática.

"Sei que tenho condições de viver o fim de meus dias com dignidades nesta terra maravilhosa, como outros militantes políticos de esquerda da época o estão fazendo. Sei que posso continuar minha carreira de escritor e tradutor sem interferir em assuntos internos.

"Vim para o Brasil pois sabia do calor e do acolhimento que aqui receberia. Sabia também que o Brasil acolhe perseguidos políticos. Hoje tenho certeza que reúno condições de aqui trabalhar, de trazer minha família para perto, de estar ao lado de meus amigos que mesmo vivendo do outro lado do Atlântico nunca me deixaram só.

"Recebi com muita alegria a mudança de orientação do governo francês, que decidiu não mais extraditar Marina Petrella. Ela não merecia a morte, e Mitterand havia dado a todas nós a palavra de que não seriamos extraditados. Sarkozy procura o caminho dos grandes estadistas quando dá a mesma palavra para as FARCs e quando protege Marina da morte que seria certa. A verdade é que tudo isso me dá no mínimo o direito de sonhar que serei aceito como refugiado político nesta terra maravilhosa chamada Brasil e que um dia poderei ver a verdade restabelecida também na França e na Itália."

segunda-feira, 1 de dezembro de 2008

"NÃO ACREDITO QUE O GOVERNO LULA EXTRADITE CESARE BATTISTA PARA AGRADAR BERLUSCONI, SARKOZY E A GRANDE IMPRENSA BRASILEIRA"

Um jornalista brasileiro que ainda conserva o senso de justiça e a coragem para afrontar os poderosos é Ruy Martins, hoje vivendo na Suíça e colaborando com jornais portugueses, além do site Direto da Redação ( http://www.diretodaredacao.com/ ).

Batalhador incansável para que o caso de Cesare Battisti tenha uma solução civilizada, Martins comentou com justa indignação a negativa do Conare em conceder refúgio para o escritor italiano. Eis os trechos mais marcantes:

"Quando se sabe que muitos atuais parlamentares e gente do governo lutou contra a ditadura militar, parece estranho que concordem em punir o militante italiano dos anos 60, Cesare Battisti, que nega mesmo ser autor dos crimes dos quais vem sendo acusado. Não acredito que o governo Lula extradite Cesare Battisti para agradar Berlusconi, Sarkozy e a grande imprensa brasileira, que nesta questão conta com o estranho apoio da revista Carta Capital.

"Battisti é acusado de ter cometido crimes, quando jovem, em nome de um movimento de extrema-esquerda italiano. Há quase trinta anos, Battisti vive como foragido. Na França, no governo de Mitterrand, tinha encontrado abrigo, pois o presidente socialista francês havia dado refúgio aos italianos envolvidos nas agitações da época da Brigada Vermelha.

"Durante a campanha eleitoral, o atual presidente francês, com o objetivo de agradar os eleitores de direita, decidiu entregar Battisti à Itália, onde está condenado à prisão perpétua, num julgamento à revelia. Battisti conseguiu fugir mais uma vez e se escondeu no Brasil, onde foi localizado quando alguém de Paris ia lhe entregar algum dinheiro para sobreviver.

"Ao mesmo tempo, outra militante daquela época, Marina Petrella, que vivia normalmente na França, foi presa e ia ser extraditada para a Itália. Entretanto, ao ser separada de sua filha e de sua família para ser enviada à Itália, Marina entrou num processo depressivo e estava perto da morte quando, por intervenção da cunhada do presidente Sarkozi, foi suspensa definitivamente sua extradição para a Itália, onde deveria cumprir prisão perpétua.

"Cesare Battisti é o último dos italianos que a Itália quer recuperar para deixar apodrecer na prisão. Além de negar ter praticado crimes de morte, Battisti se tornou escritor no exílio forçado, quando vivia no México, casou, tem duas filhas e sua extradição, por acusações de atos cometidos há trinta nos, não seria um ato de justiça mas de vingança da Itália berlusconiana.

"Hoje, no Brasil, diversas personalidades que lutaram contra a ditadura fazem parte do governo e seria um absurdo extraditarem alguém que, na juventude, também lutou contra o que acreditava ser um Estado totalitário.

"(...) É hora de se passar a esponja nos excessos políticos da juventude italiana de há 30 anos. Fernando Gabeira, o senador Suplicy já se pronunciaram em favor do asilo a Cesare Battisti no Brasil, porque se trata de um foragido político e não um autor de crime comum.

"O Brasil deve dar a Cesare Battisti o asilo para que possa trazer a esposa e filhas. E iniciar, em terra brasileira, uma outra fase de sua vida, num país de justiça e liberdade.

"A negativa da Conare constitui um retrocesso em matéria de direito internacional, por considerar como acusado de crime comum um notório militante de um grupo politico italiano. É uma inexplicável concessão do Brasil ao pedido de dois presidentes europeus, em detrimento de uma tradição do asilo do governo brasileiro a todos os perseguidos e de uma independência que o Brasil fazia questão de manter nessa matéria."

PEÕES DE OBRAS, OS ESCRAVOS MODERNOS

“Subiu a construção como se fosse máquina
Ergueu no patamar quatro paredes sólidas
Tijolo com tijolo num desenho mágico
Seus olhos embotados de cimento e lágrima
(...) E tropeçou no céu como se fosse um bêbado
E flutuou no ar como se fosse um pássaro
E se acabou no chão feito um pacote flácido
Agonizou no meio do passeio público
Morreu na contramão atrapalhando o tráfego”
(“Construção”, Chico Buarque)

Os peões da construção civil têm de trabalhar em situações que sabem ser perigosas, contraem parasitas bebendo água impura nos canteiros de obras e sofrem distúrbios auditivos em razão dos ruídos excessivamente altos a que são expostos sem proteção adequada.

É o que se depreende de uma pesquisa realizada com 2.428 trabalhadores do setor, em 41 empreendimentos da Grande São Paulo, Baixada Santista e Vale do Paraíba.

Eis algumas das constatações:
· 54,7% apresentam parasitas (protozoários e vermes);
· 3,4% têm perda auditiva relacionada ao trabalho;
· 24,3% sofrem irritação quando expostos a sons intensos;
· 11,5% relatam dores de ouvido;
· 43,2% dizem ter perda de equilíbrio (sintoma de labirintite);
· 43,4% precisam de intervenção médica para aliviar dores assim que possível e 25,5%, imediatamente;
· 38,6% acreditam que correm perigo sempre ou com freqüência, na fase de estrutura e alvenaria da obra.

Tais dados constam do Manual de Segurança e Saúde no Trabalho: Indústria da Construção Civil - Edificações, que será lançado hoje na sede da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo.

O capitalismo continua tão selvagem para os peões de obras no Brasil como o era para as crianças que trabalhavam até 12 horas diárias nas minas de carvão européias.

Haruo Ishikawa, um dos vice-presidentes do Sindicato da Indústria da Construção Civil do Estado de São Paulo, não hesitou em culpar esses escravos modernos pela condição subumana a que foram reduzidos: “Os médicos têm orientado em relação ao banho e às necessidades fisiológicas -- lavar as mãos, p. ex.".

Não disse uma palavra sobre a água imunda que são obrigados a beber nos canteiros de obras, por falta de outra.

Já Antônio Pereira, superintendente do Ministério do Trabalho e Emprego, diz que a culpa por esses números "graves" é também da "falta de planejamento das empresas".

Discordo. O planejamento das empresas é perfeito para obterem o que almejam, a maximização dos lucros, pouco lhes importando os danos criminosamente infligidos à saúde e à vida dos trabalhadores.
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