segunda-feira, 9 de abril de 2012

UMA LEMBRANÇA DISTANTE PASSADA A LIMPO

Muita água passou debaixo da ponte desde aquele domingo em que, como quase sempre fazia, acompanhei meu pai ao seu  bico  de fim de semana.

Além do trabalho exaustivo numa fiação, ele sacrificava seu repouso para botar mais dinheiro em casa: recolhia apostas em corridas de cavalo, em troca de uma comissão de 10%. Repassava-as por telefone a um tio-avô que vivia disso.

Este parente (*), que lembrava muito o  Amigo da Onça (grande Péricles!), descarregava os jogos pesados em outras bancas, segurando só os que teria como pagar.

Então, na ampla casa do meu avô, os apostadores iam fazer sua fezinha e alguns passavam a tarde lá, assistindo ao futebol, torcendo ruidosamente na hora dos páreos televisionados (Vai! Vai! Vai! VVVVVVAAAAAIIII!!!), jogando cartas.

Eu tinha uns seis anos e brincava com quem tivesse sobrado, em pleno domingão, da turminha da rua.

Certa vez, o único que estava por lá me convidou a ir até a porta do cine Patriarca olhar os cartazes, a cinco quarteirões de distância. Fomos.

Para minha surpresa, ele convenceu um espectador a nos pagar um ingresso. Parece que fazia sempre isto, pois o porteiro, sem discutir, permitiu que eu também entrasse, dois pelo preço de um.

O filme era sobre Ali Babá. Adorei a canção tipo chiclete (gruda no ouvido...) que acompanhou os letreiros iniciais, mas... resolvi ir embora, pois não avisara o meu pai e sabia que logo iria me procurar. A responsabilidade falou mais alto, mas fiquei tão frustrado que nunca mais me saiu da cabeça a tal musiquinha.


Agora, mais de meio século depois, deparei-me num blogue de downloads com o filme Ali Babá and the forty thieves, de 1944, dirigido por Arthur Lubin. Fiquei curioso: seria este?

Fui atrás do vídeo no Youtube e constatei que não. Mas, na busca apareceu também o menos conhecido The adventures of Hajji Baba, de 1954 (d. Don Weis). Bingo!

O tema que me fascinara tinha assinatura ilustre: Dimitri Tiomkin, de quem simplesmente adoro as composições para Sem Lei e Sem Alma. E o cantor era ninguém menos do que o Nat King Cole.

O filme, picotado em 10 partes, pode ser assistido no Youtube, mas logo desisti. Não valia mesmo a pena vê-lo por completo.

Pelo menos a canção não me decepcionou, como costuma acontecer com as lembranças que o tempo e a imaginação maquilam na nossa mente.

Caso dos gols guardados com tanto carinho na memória, mas que hoje, revistos no Canal 100, mostram-se até banais, não resistindo à comparação com os de Messi e Neymar.

No fundo, talvez gostemos mesmo é de evocar o que éramos... e nunca mais seremos.

* Uma saia justa dele. Era palmeirense fanático e, como tal, dizia cobras e lagartos dos torcedores corinthianos, "aquela baianada burra". Até que, sei lá por que cargas d'água, tornou-se proprietário de um armazém de artigos nordestinos na Vila Prudente, apropriadamente chamado de O bom baiano. Fui lá duas ou três vezes apenas para curtir com a sua cara e ironizar os esforços que fazia agradar à distinta clientela... 

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