quinta-feira, 12 de janeiro de 2012

O DIA EM QUE COLOQUEI O SECRETÁRIO DA CULTURA DE CÓCORAS

Os pogrons que as tropas do czar... digo, as hostes do Alckmin desencadearam contra viciados e coitadezas vêm sendo atribuído, pelos perspicazes, à intenção de sanear a região da Luz para grande$ empreendimento$. O de sempre.

O tal Projeto Nova Luz me fez lembrar um anterior na mesma região, o Luz Cultural --pivô de episódio saboroso, uma das mais gratas lembranças da minha carreira jornalística.

Assim é que, em 03/10/1985, um grupo de defensores da memória histórica impediu que se continuasse a demolir uma edificação existente no quartel do Batalhão Tobias de Aguiar.

Fui cobrir como repórter de Geral de O Estado de S. Paulo e o resultado foi a notícia O projeto ia proteger o bairro. Está destruindo, que relatava:
"A Secretaria Estadual da Cultura e diversos órgãos públicos, ao desencadearem o processo de revitalização cultural da região da Luz, talvez tenham destruído a primeira usina elétrica de São Paulo, que aliás inspirou o nome do bairro.

...a demolição jamais poderia ter sido iniciada sem a autorização do Condephhat, que garante ter enviado ofício exigindo a paralisação da obra.

...ontem à tarde, 32 homens trabalhavam em ritmo intenso, removendo essa parte do passado com dois tratores de esteira e um carregador de sucata".
A ordem era preservarem só a torre à dir.,
que foi alvejada por canhoneio em 1922.
A editoria gostou e me mandou continuar no caso. Mantive o pique, nos dias seguintes: Condephaat analisa caso de destruição; A demolição na Luz expõe secretário da Cultura a ação penal; Projeto Luz é sem sentido, diz historiador.

O secretário da Cultura, Jorge Cunha Lima, entregou os pontos. Mandou me chamar e, em  off, reconheceu ter cometido um erro, mas disse que isto não era motivo para o  Estadão  detonar o projeto de revitalização como um todo. Ou seja, ofereceu a  mea culpa   como contrapartida para encerrarmos a série.

Os editores adoraram sair por cima, tanto que concederam um espaço nobre para a notícia final, Depois da demolição, o secretário admite erro. Ocupou metade da contracapa do jornal --a qual, naquele tempo, ainda não pertencia ao Caderno 2.

Mostrando muito senso de oportunidade, o fotógrafo que me acompanhava pediu ao secretário, com o ar mais inocente do mundo: "Dr. Cunha Lima, o senhor poderia nos mostrar no mapa onde, exatamente, o projeto está sendo executado?".

O mapa estava encostado numa parede, no chão. Cunha Lima caiu como um patinho. Acocorou-se para apontar e... click! A foto, claro, foi a que o jornal escancarou. Fazia parecer que Cunha Lima estava se penitenciando, exatamente como o título da notícia dizia.

Durante uns tempos, fiquei matutando se não teria pegado pesado demais com esse tolo pomposo.

Mas, noutro emprego, ocorreu-me conversar com um dos sócios-proprietários sobre Cunha Lima.

Múcio Borges da Fonseca havia sido um dos diretores de redação mais jovens da imprensa brasileira. Comandava a Última Hora em Pernambuco, quando houve a quartelada. E permaneceu bravamente à frente da redação, até que os golpistas acabaram com o jornal e com seu emprego.

Não chegaram a prendê-lo, mas ficou  queimado  demais para permanecer por lá. Veio tocar a carreira em São Paulo, onde acabaria sendo um dos fundadores da Editora Três e, depois, da Unipress Editorial (foi aí que o encontrei).

Contou-me o Múcio que bem diferente fora o comportamento de Cunha Lima, o diretor de redação da Última Hora de São Paulo. Logo no funesto 1º de abril de 1964 abandonou o barco, deixando-o à matroca. Quando deu as caras, uns 10 dias depois, nada havia para se salvar.

Não tive mais remorso nenhum.

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